sábado, 3 de maio de 2014

O Globo, sobre o "volta Lula", um sebastianismo "déplacé".

Dilma terá que conviver com ‘volta, Lula’, até o fim da campanha, dizem analistas

  • Três fatores estariam amarrando o desempenho da presidente: o fraco desempenho econômico, a falta de um legado próprio e o carisma do ex-presidente
Renato Onofre (Email · Facebook · Twitter)
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SÃO PAULO - O “Volta, Lula” não vai acabar. Na avaliação de cientistas políticos e analistas entrevistados ontem pelo GLOBO, o movimento, que nasceu no PT e contaminou parte da base aliada da presidente Dilma Rousseff, vai fazer sombra ao projeto de reeleição da petista até às vésperas da eleição, se ela não conseguir reverter a tendência de queda nas pesquisas.

Três fatores, segundo analistas, estariam amarrando o desempenho da presidente: o fraco desempenho econômico de seu governo, a falta de um legado próprio de sua gestão e o carisma indiscutível do ex-presidente, capaz de acalmar a base e unir a militância petista.

— Ela passou pouco mais de três anos de governo tomando medidas paliativas em quase todas as áreas. Não conseguiu pôr em prática um projeto para o país enfrentar este momento de crise — avaliou o cientista político e professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Rudá Rocci.

A força do “Volta, Lula” fez com que a presidente reagisse esta semana. Em entrevista a editores de esportes na segunda-feira, declarou: “ninguém vai me separar do Lula nem ele vai se separar de mim”, em referência clara às investidas de aliados no ex-presidente. Para o cientista político Marco Antônio Teixeira (FGV-SP), as declarações são indícios do caminho que ela escolheu para tentar garantir sua candidatura à reeleição:

— Ao chamar para si a responsabilidade, Dilma tenta conseguir o protagonismo interno no processo (eleitoral). Se ela conseguir trazer para si essa responsabilidade, pode ser que a base se acalme e o eleitor veja nela alguém capaz de superar essa crise.

A sombra do ex-presidente não afeta só Dilma. Tanto para Rocci quanto para Marco Antônio Teixeira, não há na oposição um projeto alternativo que supra a carência e os desejos da população. E, por isso, há uma recordação do bom momento vivido por Lula nos oito anos de governo.

— O “Volta, Lula” não é um gesto (único) do PT. Ele extrapola a base do governo. Ele é puxado pelo legado imposto pela gestão do Lula, reconhecido pela população como o cara que criou o Bolsa Família, mas também pelo setor empresarial, que teve, durante sua passagem pela Presidência, um forte investimento estatal — explicou Teixeira, frisando que o presidenciável Aécio Neves (PSDB) perdeu o “timing” para ser essa voz que o eleitor procura, e que o outro oposicionista, Eduardo Campos (PSB), também terá que lidar com uma sombra:

— O Aécio só agora assume a posição de confronto com o governo. Ele poderia ter sido essa voz nos três anos de governo Dilma. Agora, pode ser que o eleitor interprete a mudança de postura como eleitoral. Já a Campos falta capilaridade política nos estados para replicar o seu discurso, e ele ainda tem que lidar com uma sombra própria (Marina Silva, sua companheira de chapa).

Para o filósofo Roberto Romano, no entanto, as motivações do crescimento do coro pedindo a volta do ex-presidente não estão claras. Ele diz que a diferença de personalidade entre Lula e Dilma pode ajudar a entender um pouco o cenário.

— As motivações imediatas ainda são obscuras. Não dá para fazer um retrato ideal ainda. Minha hipótese provisória é que a predominância do marketing no processo eleitoral fez com que a presidente esquecesse do básico, que é fazer política.

Para reforçar essa tese, Romano afirmou que Lula consegue unir e costurar alianças de grupos diferentes, como as “oligarquias tradicionais” comandadas por José Sarney e Fernando Collor, com grupos operários do ABC, por conta do seu perfil carismático. Já Dilma traz consigo o peso das marcas da luta armada e o tecnicismo burocrático da universidade, que não ecoam na maioria da sociedade.

— Dilma é uma burocrata acadêmica. Traz consigo uma visão lógica e racional, mas lhe falta intuição política. Isso é claro até dentro do PT. Ela não consegue dialogar com a militância, que teve de engoli-la por conta do Lula.

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