Para o rabino chefe de Roma, Riccardo Di Segni, "a tese cara a Bento XVI de que o nazismo era ateu deveria ser melhor aprofundada. O nazismo ateu é um mito a ser desfeito".
A reportagem é de Giacomo Galeazzi, publicada no jornal La Stampa, 10-08-2009. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis a entrevista.
O senhor está satisfeito com o Ângelus sobre os campos de concentração?
Não vejo passos adiante. O problema continua sendo a sua interpretação da Shoah e do nazismo, isto é, de um bando de delinquentes que teve toda a nação alemã nas mãos. Com relação a essa tese, o Ângelus não traz modificações substanciais. Bento XVI foi contestado, por várias partes, nas visitas a Auschwitz e ao Memorial do Holocausto Yad Vashem, porque mantém bem separados a Alemanha e o povo alemão das responsabilidades do nazismo. Com relação a esse problema, não me parece que agora o Papa tenha se afastado da sua linha.
A deportação da judia convertida Edith Stein, lembrada pelo Papa, demonstra que, quando a Igreja na Holanda denunciou o nazismo, as perseguições aumentaram...
Os termos reais da questão são diversos. Os nazistas usavam os judeus batizados como uma zona cinza, semiprotegida para induzir a Igreja a calar. Na captura do gueto de Roma do dia 16 de outubro de 1943, 1.300 pessoas foram detidas, mas, por ordem de Berlim, os convertidos ao cristianismo foram liberados. Portanto, era uma extorsão, uma troca, porque, na lógica da época, os judeus batizados eram muito mais caros à Igreja. Na Holanda, não houve um endurecimento generalizado. Os nazistas também não se preocuparam com os judeus batizados como Edith Stein para mandar uma mensagem à Igreja, para não serem perturbados nas deportações.
O senhor compartilha da interpretação ratzingeriana do nazismo como negação de Deus?
A tese cara a Bento XVI de que o nazismo era ateu deveria ser melhor aprofundada. O nazismo ateu é um mito a ser desfeito. As SS tinham escrito "Deus está conosco" em seu cinturão, portanto, de algum modo, os nazistas tinham uma imagem de Deus sua. O niilismo, pois, é toda uma outra questão. Muitas vezes, na recente reflexão no âmbito católico, o nazismo é reduzido a uma ideologia anticristã que queria atingir a fé cristã na sua raiz abraâmica. Mesmo que isso pode ser em parte verdadeiro, a ênfase de apenas esse conceito leva quase a uma conclusão paradoxal: que os judeus teriam pago, só eles por causa dos cristãos, por um ódio que não lhes tocava, nem ao menos tão diretamente. E isso sem mencionar habitualmente os responsáveis, cúmplices ou silenciosos. |