sábado, 5 de dezembro de 2009

Gazeta do Povo 05/12/2009

Mensalão do DEM coloca a oposição nas cordas

Corrupção no Distrito Federal e valerioduto do PSDB tiraram dos oposicionistas o discurso da ética. Democratas e tucanos também não têm projeto de governo alternativo ao de Lula
Publicado em 06/12/2009 | Rhodrigo Deda



O escândalo do DEM no Distrito Federal e a aceitação da denúncia do mensalão tucano pelo Supremo Tribunal Federal (STF), na semana que passou, colocaram a oposição ao governo Lula nas cordas. Como a administração petista seguiu a linha macroeconômica herdada da gestão Fernando Henrique Cardoso e ampliou programas sociais criados na era FHC (caso do Bolsa Família), a grande diferença que poderia existir entre governistas e oposicionistas estava no campo ético e em propostas inovadoras para o Brasil. Mas o DEM e o PSDB, principais legendas da oposição, não estão conseguindo propor nada de novo em relação ao governo Lula.

O DEM vinha adotando um discurso pautado pela ética e pela cobrança dos desvios da gestão Lula. O governo do Distrito Federal, única unidade federativa comandada pelos democratas em todo o país, era considerada uma espécie de vitrine da legenda – lá estava sendo implantada uma gestão voltada para resultados.



Capital da corrupção

Norte-americano naturalizado “brasiliense”, o cientista político David Fleischer costuma usar um episódio pessoal para explicar a corrupção na capital brasileira. Ele conta que em uma visita a parentes que moram em São Paulo, no fim dos anos 80, os dois filhos pequenos ficaram irritados com a provocação de que em Brasília só havia bandido. “Não, os bandidos são aqueles que vocês elegem e mandam para lá”, retrucaram as crianças.


Mas o sonho democrata acabou com as investigações da Polícia Federal que apontaram a existência de um suposto esquema de propina no governo do Distrito Federal. O episódio, que envolve entre outras coisas o pagamento de dinheiro para a base aliada na Câmara Legislativa do DF, já foi batizado de “mensalão do DEM” – numa comparação ao suposto esquema montado no Congresso Nacional pelo governo Lula, durante a sua primeira gestão.

O PSDB também fechou a semana no noticiário com um revés no campo da ética. Na quinta-feira, o STF abriu processo criminal contra o senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG), acusado de desvio de recursos públicos e caixa 2 na campanha de 1998, quando disputou a reeleição para o governo de Minas Gerais e perdeu para Itamar Franco. O caso de Azeredo é conhecido como “mensalão mineiro”, pois funcionava do mesmo modo que o esquema petista e também teve como articulador o publicitário Marcos Valério.

Sem projeto

Com esses episódios, o discurso da ética da oposição, numa contraposição a supostos desvios do governo Lula, ruiu. Na avaliação da cientista política Luciana Veiga, da UFPR, o discurso da ética adotado pelo DEM foi uma estratégia arriscada. Segundo ela, sem conseguir articular um programa de governo para o país, o DEM optou pelo discurso moralizante. “Essa postura é complicada para qualquer um dos quatro grandes partidos (PT, PSDB, PMDB e DEM). O DEM pauta sua atuação pela ética e de repente acontece um episódio como o do (governador José Ro­­berto) Arruda.”

A oposição também vem tendo dificuldades em estabelecer um programa de governo diferente do que está sendo tocado pelo PT. Para Luciana Veiga, essa dificuldade existe, em parte, devido aos altos índices de aprovação popular da gestão Lula. “Quando um governo tem 70% ou 80% de aprovação, é difícil haver um distanciamento (de projetos)”, explica Luciana. “Como propor algo diferente nessas circunstâncias?”

Já o coordenador da FGV Opinião, Marcelo Simas, lembra que o PSDB e o DEM foram os responsáveis por implantar no país uma política de estabilização da economia durante os dois governos de FHC (1995-1998 e 1999-2002). Depois, essa política foi incorporada pelo governo Lula. Assim, diz ele, a agenda política que era encampada pelos tucanos e democratas tornou-se consenso. “É como se estivesse superada”, afirma Simas. “Hoje é como se os dois grupos (PT e oposição) estivessem compartilhando as mesmas propostas.”

A oposição também tem facilitado a aprovação, no Congresso, de propostas de interesse do presidente Lula. “Praticamente todos os projetos importantes são aprovados com votos dos partidos de oposição”, afirma o professor de Ética e Política Roberto Romano, da Universidade de Campinas.

Segundo ele, no Brasil, fazer oposição é praticamente suicídio político. Romano explica que a sobrevivência política de parlamentares depende essencialmente dos recursos que eles conseguem levar para as suas bases eleitorais. “E, para isso, é preciso negociar a aprovação de projetos com o governo.” Por essa lógica, oposicionistas que se recusam a votar projetos do governo não conseguem ter emendas orçamentárias liberadas para as suas bases.

Escândalo brasiliense

Dida Sampaio/Agência Estado
Dida Sampaio/Agência Estado / Durval: denunciador do esquema Durval: denunciador do esquema
Operação Caixa de Pandora
Espionagem marca relação de Arruda com o pivô do caso

Publicado em 06/12/2009 | Agência Estado


Investigações da Operação Caixa de Pandora indicam que o denunciante do mensalão do DEM, o ex-delegado Durval Barbosa, teve o aval do ex-governador do DF Joaquim Roriz para pôr o suposto esquema de propina que operava na Codeplan – responsável pela administração dos gastos da máquina pública – a serviço da candidatura de José Roberto Arruda ao governo do Distrito Federal, em 2006. Após a eleição, ele teria cobrado a conta, o que lhe garantiu o cargo de secretário distrital de Relações Institucionais.

Inicialmente Arruda teria rechaçado a pressão, mas acabaria convencido pelos arquivos exibidos por Barbosa num laptop, com fotos, diálogos grampeados e imagens de corrupção explícita gravados por ele. Numa delas, o próprio governador aparece recebendo R$ 50 mil, dinheiro que mais tarde vinculou a uma alegada compra de panetone para os pobres.

Capital da corrupção

Sem saída, Arruda deu o cargo a Barbosa, mas mandou sua polícia secreta, a P2 da PM, espioná-lo. Os policiais descobriram que ele tinha uma amante regular – chegaram a fazer fotos dos encontros furtivos do casal. Arruda teria feito chegar ao secretário a descoberta, a fim de que um acerto mantivesse tanto esse segredo quanto o esquema de distribuição das propinas.

Havia, no entanto, mais uma carta nesse jogo – a mulher do secretário, a empresária Fabiani Barbosa, dona da Dot Paper, a quem o marido havia entregue cópia de todos os vídeos que fizera, temendo ser assassinado. Ao saber da história da amante por uma amiga, Fabiani armou um flagrante de adultério.

O casal rompeu, e ela ameaçou contar tudo, segundo relato de um policial e de um membro do Ministério Público que participam da investigação. Fabiani nega que conhecesse o esquema, mas confirma a traição e a briga com o ex-marido. Ela é mencionada numa conversa de 55 minutos, interceptada com autorização judicial, entre o ex-marido e Arruda. O governador temia que Fabiani, ressentida com a traição, delatasse o propinoduto e desse munição aos opositores. Barbosa o tranquiliza dizendo que ela “seria incapaz” de um ato desse tipo. “Eu não sabia de nada dessas coisas, fiquei muito triste”, afirmou Fabiani. “Por isso não quero que me vinculem a ele.”

Durval foi quem denunciou o “mensalão do DEM”. Primeiro sozinho e, depois com o monitoramento policial e judicial, ele fez mais de 30 vídeos onde deputados distritais, secretários de governo, empresários e o governador aparecem negociando e recebendo dinheiro de suas mãos. O ex-delegado fez um acordo de delação premiada em troca de redução de pena por seus crimes – responde a 37 processos na Justiça.