domingo, 31 de Janeiro de 2010
A batalha interminável
Nos últimos tempos tenho lido muito, várias coisas ao mesmo tempo como
é habitual. Muitas coisas de autores espanhóis (Henrique de Hériz "Mentira", J.J. Armas Marcelo "Quase todas as mulheres", Arturo Pérez-Reverte, entre outros), mas também um livro de um peruano (Alfredo Echenique, com o excelente romance "O Horto da Minha Amada") e outro de um chileno. Pelo meio Agualusa "O vendedor de passados", Philipe Claudel, etc.
Mas veio parar-me às mãos um livro de David Talbot, publicado em 2007, e denominado "Brothers" ("Irmãos" na versão portuguesa editada pela Casa-das-Letras). Os livros são assim, escolhem os leitores. Aliás, se tivermos tempo e os formos visitar com regularidade nos locais onde costumam estar (eu gosto da FNAC em Coimbra-Fórum e Lisboa-Chiado, da Almedina e da Bertrand em Coimbra-Estádio, mas também as muitas feiras do livro e alfarrabistas), eles escolhem também o momento. Por isso vejo os livros também com as mãos. São objectos vivos que vêm ter connosco.
"Brothers" é um livro sobre a vida de duas pessoas que queriam mudar o mundo: os irmãos John (JFK) e Robert (RFK) F. Kennedy. Um livro que não consegui parar de ler e que me ocupou a mente durante muito tempo.
É um livro sobre dois homens que tinham o objectivo de mudar a América e com isso mudar o mundo. Acabar com a guerra fria, concentrar os esforços na paz, no desenvolvimento social, na igualdade de direitos independentemente de raça ou nacionalidade, no bem-estar dos povos.
O livro conta a história dos dois irmãos, vista pelo ângulo de RFK, baseado em documentos recentemente desclassificados e em mais de 150 entrevistas e depoimentos. Um relato impressionante sobre o ambiente que conduziu aos assassínios de JFK em Dallas em 1963 e de RFK em Los Angels em 1968. O papel da CIA e da máfia, a guerra fria, Cuba e Fidel Castro, a luta pelos direitos civis (crise na Universidade do Alabama), etc., mas especialmente a procura de acordo com Krushev, a Baía dos Porcos, a crise dos mísseis de Cuba e o combate à corrupção e à máfia, são as principais razões que conduziram à conspiração que matou os dois irmãos.
Crise dos mísseis - 1:
Crise dos mísseis - 2:
Discurso sobre sociedades secretas:
Anúncio ao país depois da crise na Universidade do Alabama:
Em Berlin:
A new world of law. Let us begin. Ask not what your country can do for you, ask what you can do for your country, Ask not what America can do for you, but what together we can do from the freedom of man:
A morte de JFK e o aparente desinteresse de RFK, nos anos seguintes, sobre a morte do irmão mostram um mundo negro de falta de lealdade, cumplicidades, traições e cobardias, o posicionamento dúbio dos órgãos de comunicação social (é impressionante o posicionamento do Washinghton Post liderado por Bradlee (que Jackie Kennedy considerava, a ele e à esposa, "os nossos melhores amigos") sobre a conspiração que matou JFK), e da indústria do cinema com fortes ligações à máfia. Dizia-se que a CIA tinha cerca de 400 jornalistas pagos para defenderem as posições da agência. Um lado negro e obscuro que se abateu sobre JFK, e que RFK imediatamente percebeu no próprio dia do crime, vivendo os anos a seguir com a culpa de não ter sabido, podido ou conseguido proteger o irmão de tal ameaça. Uma culpa de que só se conseguiu libertar, em 1968, com a campanha presidencial que lhe deu a morte no próprio dia em que venceu as primárias da Califórnia.
RFK speeches:
Mas esta história e este livro mostram bem duas coisas:
1. A força da ligação entre JFK e RFK. Irmãos de verdade, cúmplices e parceiros. Determinados e focados na tarefa de mudar o mundo. A dimensão heróica da sua tarefa, num país cheio de cowboys e falcões, na forma como lidaram com a guerra e a evitaram, com Fidel e Cuba, na habilidade na diplomacia paralela, na grandeza e desinteresse, no desprezo pela sua própria sorte: viviam como pensavam, sem pensar como viveriam
2. A força e determinação da equipa que reuniram. O valor da lealdade e amizade que os unia.
3. O sentido de dever e a força das suas convicções.
Em 1963 a América perdeu o seu ultimo líder, num crime horrível que mostrou bem o lado negro da América. Ia recuperando em 1968, mas mais uma vez a morte pela força não deixou. Como dizia Ruben "Rocky" Carbajal, amigo de infância de David Morales (o operacional da CIA envolvido na morte de JFK e RFK), "o presidente Kennedy fez merda, causou todas aquelas mortes na Baía dos Porcos, mandou retirar aviões, os homens foram apanhados em terra. Quer que tenha respeito por um presidente destes? Ou por um palerma como o irmão? E ainda por cima entregaram o raio do país aos negros!"
Sem liderança e sem esperança desde 1963, é um negro, justamente, que devolve a esperança, à América e ao mundo, num futuro melhor. Como JFK e RFK gostariam de ver este momento
:-)