quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Canal IG, 11/02/2010



  • Para especialistas, Caso Arruda mostra que falar, omitir e mentir são instrumentos de poder vistos como normais pelos políticos

    11/02 - 20:38 - Gustavo Gantois, iG Brasília

    José Roberto Arruda é o exemplo típico do político brasileiro que, compulsivamente, mente, faz conluios e menospreza a inteligência alheia. Essa é a opinião de especialistas que o iG consultou na intenção de traçar o perfil do agora governador licenciado do Distrito Federal.

    Preso pela Polícia Federal por uma decisão do Superior Tribunal de Justiça, Arruda é reincidente em escândalos políticos. Da primeira vez, em 2001, quando era senador e foi acusado de violar o painel do Senado na votação que cassou o mandato de Luiz Estevão, Arruda debruçou-se na tribuna e chorou ao afirmar sua inocência. Não adiantou e ele foi obrigado a renunciar.

    No caso recente, Arruda utilizou de panetones e versões inverossímeis de bilhetes escritos de próprio punho para tentar convencer a população de que falava a verdade. Mais uma vez, não deu certo.

    “Ele é produto de um sistema político arcaico e aristocrático, que se julga superior aos mortais pagantes de impostos e só está interessada em fazer acordos espúrios e favorecer os seus pares”, analisa Roberto Romano, professor de Ética e Filosofia da Universidade de Campinas. “Ele não tem o famoso desconfiômetro para a questão ética”.

    A prisão de Arruda, inclusive, é motivo de comemoração. “Não entendo porque a Justiça ainda aceita o privilégio do foro quando ele é a notória quebra do princípio da igualdade de todos perante a lei”, afirma Romano. “Fico animado quando vejo que juízes assumem a responsabilidade de lembrar aos ditos homens públicos que eles tem deveres a cumprir”.

    Linhagem política
    Para o antropólogo Roberto DaMatta, a política brasileira passou a ser o espaço do conquistador, do trêfego e do sujeito voraz pela coisa pública. De acordo com ele, Arruda vem da “mesma linhagem política do Sarney e do Maluf, onde o estilo ‘rouba, mas faz’ virou sinônimo de manutenção do poder”.

    “A consciência desses sujeitos é a de que se ele não roubar, outro vai lá e rouba”, diz DaMatta. “E o pior é que eles criam uma cultura do puxa-saquismo oficial que estimula o surgimento de seres que só fazem perpetuar esse vício”.

    Sociedade culpada
    Mas se há políticos que se manifestam desta forma, a culpa não é uma exclusividade deles. “Arruda é um fenômeno de desprezo da sociedade brasileira em relação à política”, afirma o cientista político Murillo de Aragão, da Arko Advice. “Ele não é novo, não é o primeiro e nem será o último de um sistema político que ainda é precário”.

    Para Aragão, “o falar, o omitir e o mentir são instrumentos de poder” vistos como normais pelos políticos. “Há um estabelecimento de um cabo de guerra que resulta, como único caminho, a Justiça”, completa o cientista político.

    A opinião é compartilhada pela psicanalista Sueli Gevertz. Segundo ela, o caso do governador licenciado do Distrito Federal é um emblema da questão ética que resvala na capacidade da população de escolher seus mandatários.

    “As pessoas já não sabem mais quem representar e muito menos quem elas escolhem para serem representadas”, teoriza Gevertz. “O que mais surpreende nessa história é como os brasileiros insistem em cair nessas mentiras. Sendo assim, não sei se os políticos, e Arruda em especial, menosprezam a nossa inteligência, mesmo porque nós não estamos nos mostrando inteligentes em escolhê-los”.