Domie fevereiro de 2010 - 08h07
Punição de políticos mostra avanços e interesse eleitoral, dizem analistas
Arruda está preso há 17 dias em sala especial para autoridades na Polícia Federal por envolvimento em esquema de corrupção
Martina Cavalcanti
brasil@eband.com.br
Ainda que as atuais punições contra membros do DEM envolvidos em escândalos de corrupção representem vitórias do Judiciário, elas também sinalizam o interesse do governo em enfraquecer a oposição em ano eleitoral, afirmam especialistas. “A lei é cumprida, é verdade, mas por trás da lei há sempre os interesses políticos”, afirmou o professor de Ciências Políticas da UnB, Paulo Nascimento, ao eBand. “A questão é que a lei é aplicada por quem tem maior poder.”
No último dia 11, o governador afastado do Distrito Federal, José Roberto Arruda (sem partido) teve prisão decretada pelo STJ (Superior Tribunal Federal), acusado de tentar subornar uma testemunha do inquérito que investiga o suposto esquema de desvio de verbas públicas e compra de apoio político no DF. Arruda, ex-membro do DEM e apontado como chefe do esquema, tinha grande popularidade antes do escândalo e era cotado para ser vice na chapa do provável candidato tucano à Presidência, o governador de São Paulo, José Serra.Outro aliado de Serra, o prefeito da capital paulista, Gilberto Kassab, foi cassado em primeira instância no último final de semana, por recebimento de doações irregulares na campanha eleitoral que o elegeu em 2008. A cassação foi suspensa até que o recurso apresentado pela defesa do prefeito seja julgado. Serra deve ser o principal rival da candidata do governo (PT), a ministra Dilma Rousseff (Casa Civil).
Interesses“Seria falso dizer que não há interesse do governo em ano eleitoral em promover essas punições”, disse Roberto Romano, cientista político da Unicamp. Com as medidas, a intenção do governo não é a de acabar com a corrupção, mas de “expor as feridas dos outros enquanto esconde as suas”, tática política aplicada desde a democracia grega, há dois mil anos, afirma o analista. Romano cita que o mensalão do PT, “ferida” do partido que ganhou a atenção do público em 2005, é tratado hoje “apenas” como caixa 2 pelos líderes do PT.
É consenso entre os dois analistas que, apesar da finalidade eleitoreira, a lei foi cumprida e a Justiça merece os créditos pelas punições. “Não se pode confundir essa guerra política com vitórias indicativas da Justiça. No caso de Brasília, foi uma vitória significativa”, afirmou Romano. “Seria muito pior se o governador tivesse sido cassado somente por pressão do movimento popular sem passar pelo institucional”, opinou Nascimento. “Tudo está seguindo os trâmites institucionais, o que é um avanço.”Para José Álvaro Moisés, professor de Ciências Políticas da USP, porém, não há indícios de interesses políticos nas decisões do Judiciário, que merece todo o crédito pelas punições. “Os dois casos [de Arruda e Kassab] mostram um papel mais ativo do Judiciário em coibir práticas de corrupção. Revelam que o poder Judiciário, na ausência de mudanças no Legislativo, está levando as leis existentes cada vez com mais vigor”.
A decisão do ministro do STJ Fernando Gonçalves em decretar a prisão preventiva de Arruda foi referendada por todos os 12 membros da Corte Especial do colegiado. Para Moisés, é “impossível” haver influência política na decisão de toda a corte.
Moralismo
Apesar de útil ao governo, o envolvimento da oposição em escândalos, segundo Romano, não deve ser usado na campanha eleitoral deste ano. “Se o PT decidir usar isso como arma, ele terá um instrumento poderoso. Mas o PSDB pode replicar com o mensalão do PT”, explica.O discurso moralista tem sido usado como instrumento em campanha “desde a época do Getúlio Vargas”, afirmou o analista. Ele acredita, porém, que hoje é “muito mais difícil manipular a opinião pública com esses truques de moralidade”. “O povo brasileiro não é o de 20 anos atrás. Ele tem através da televisão, dos rádios e dos jornais uma informação de outro gabarito.”
A imprensa também é citada por Moisés como importante fonte de conscientização dos eleitores. “Todos os partidos estão envolvidos em corrupção. A novidade é que depois do mensalão do PT, tanto a mídia quanto a opinião pública ficaram mais atentas.”
Reforma Política e futebol
Para Nascimento, apesar de informar o cidadão, a ampla divulgação de irregularidades na política pode desviar o debate eleitoral, que deveria se fixar em temas mais relevantes, como os desafios que o país tem de enfrentar, entre eles a reforma política.
A democratização da estrutura de partidos políticos é apontada por Romano como “item obrigatório da reforma política” para inibir a corrupção. Eleições primárias para renovar a direção partidária e maior poder para as bases são algumas das medidas que, de acordo com o especialista, podem ajudar a diversificar as opções dos eleitores nas urnas.
“Nada mais próximo da estrutura do partido brasileiro do que os times de futebol do Brasil. Os cartolas mandam e quem menos dá opinião é a torcida organizada, que é alma do clube”, comparou. “Sempre vem essa crítica de que o eleitor condena a corrupção, mas vota nos corruptos. É porque ele não tem chance de escolha. Quando a eleição aparece, o candidato do partido já está consagrado”, apontou o analista.