terça-feira, 24 de agosto de 2010

Correio Popular de Campinas


Publicada em 25/8/2010


Truques na propaganda eleitoral




A campanha bisonha de Serra à presidência não deve ser imputada apenas aos assessores de propaganda. O desconcerto tucano é mais grave. Já no governo FHC surgiram grupos adversários no interior do PSDB e siglas aliadas. Interesses de indivíduos e de setores definiram as candidaturas e os candidatos. Estes últimos sempre foram arrancados a fórceps do ninho, deixando para trás descontentes que sabotaram as campanhas. O PSDB vive a mesma realidade dos outros partidos. Antes, uma pergunta: será que eles merecem o nome de “partidos”? Talvez sim, levando-se em conta a polissemia do termo. Assim, só é possível afirmar que nenhum deles ostenta coesão interna, o que resulta nos programas jogados ao lixo, nas alianças espúrias etc.

Nenhuma agremiação brasileira possui, como as norte-americanas ou europeias, sistemas de consulta ao eleitor de base. Ignoramos o instituto das eleições primárias. Os partidos nacionais são propriedades de indivíduos agregados em oligarquias. Donos da máquina, dos fundos partidários, das alianças, dos candidatos, das propagandas, os oligarcas mostram abusiva longevidade: certos dirigentes estão no comando há mais de trinta anos, tiranos incontestados. Os eleitores da base partidária (perdoem a expressão dura) constituem apenas o rebanho dos tangidos pelo guante oligárquico. Sempre repito que nada mais igual aos partidos brasileiros do que o nosso futebol. Cartolas, nos dois campos, decidem tudo e lucram sempre. A torcida, bem... a torcida que se dane!

Somada à excessiva centralização em poucas mãos das decisões partidárias, vem a desastrosa assessoria de propaganda. No caso petista, exímios marqueteiros comandaram as últimas eleições presidenciais. Duda Mendonça e João Santana fizeram milagres para adoçar a figura do seu candidato. Já no campo tucano é impossível encontrar maior carga de tolices ou infantilismo. Na verdade, as bobagens começaram bem antes das eleições presidenciais. Todos recordam a falta de sensibilidade política que atentou contra um símbolo, a Petrobras, a proposta de novo batismo da firma com o hilariante “Petrobrax”. O truque foi repetido com a manipulação fônica do nome Alkmin. Os brasileiros sabem que o acento daquele nome familiar vem no final. Os gênios da lâmpada (apagada...) tucana resolveram que o acento no início atrairia incautos. Jornalistas e intelectuais escorregaram na casca de banana. Para parecer chique, o tolo elevava a sílaba inicial do nome. O truque falhou mas foi repetido: agora não seria mais Alkmin mas “Geraldo”. E José Serra (assim conhecido no Brasil desde 1963) virou o “Zé”. Será que ninguém, nos arraiais tucanos, tem um saudável desconfiômetro? Minha hipótese é mais inclemente: a arrogância sempre se impõe como péssima conselheira. A soberba se revela mesmo no modo de falar ou redigir: não existe, na frase tucana, pergunta alguma. Sempre nela se encontram lições, dogmas. Até quando cumprimentam alguém os integrantes do tucanato evidenciam pretensa superioridade. Ao estenderem a mão fica evidente o seu desejo de que o interlocutor a beije: “Como vaaai...?”.

Tolice querer que nobres tucanos modifiquem seus hábitos. Como os da Casa de Orleans, eles nunca esquecem e jamais aprendem. O tucanato, herdando os costumes acadêmicos nacionais, imagina estar acima da patuleia. Assim agiram no período FHC, assim agem nos estados em que são governo. E assim se comportam nas campanhas eleitorais. Eles deram um chute em FHC e agora tentam pegar carona no popular Lula. Truques bisonhos. Nos próximos artigos pretendo comentar alguns clássicos da propaganda política. Um deles, muito antigo, se intitula O estupro das multidões pela propaganda política, de S. Tchakhotine. O livro foi traduzido por Miguel Arraes, um vencedor de eleições. Hoje, só é possível encontrar aquele texto em sebos. Existe edição francesa atualizada (Le viol des foules par la propagande politique, Paris, Gallimard). Nenhum marqueteiro tucano o leu, mas ele, tenho certeza, reside na mesa de cabeceira, no quarto de João Santana.