segunda-feira, 11 de novembro de 2013

IHU/Unisinos


 

Os católicos alemães dão as costas à Igreja

Algo incrível. O jornal alemão General Anzeiger, um dos meios fundamentais da zona católica da Renânia, estampou, na última sexta-feira a seguinte manchete na capa: “Os católicos dão as costas à sua Igreja”. É uma voz de alerta para todos os católicos. Diz o jornal: “Em muitas partes da Alemanha, cada vez mais católicos dão as costas à Igreja”. A razão disto – entre outras coisas – é o caso do bispo de Limburg, Franz-Peter Tebartz von Elst. Na cidade de Colônia, por exemplo, na última semana abandonaram a Igreja católica 571 fiéis, quantidade duas vezes maior que na semana anterior. Mais dramática ainda é a situação em Bonn, cidade com menos habitantes, onde 312 tomaram esta decisão.

A reportagem é de Osvaldo Bayer e publicada no jornal argentino Página/12, 09-11-2013. A tradução é de André Langer.

Como se sabe, na Alemanha, cada cidadão declara a que religião pertence e assim 2% do seu salário ou de seus ganhos são descontados automaticamente e que vão diretamente para a entidade religiosa em questão. Em outros distritos, somente no mês de outubro saiu o mesmo número do total dos anos 2011 e 2012. Outras duas razões dadas pelos que se desfiliam é o abuso de crianças cometido por sacerdotes católicos, obrigados ao voto de castidade.

O editorialista desse jornal assinala na mesma edição, em um artigo intitulado “Números dramáticos”: “Não há nenhuma dúvida, o movimento de abandono dos fiéis da Igreja católica  pode ser qualificado como dramático. O motivo para dar este passo de afastar-se da Igreja, já pensado há muito tempo, em última instância, foi o escândalo do bispo católico Tebartz von Elst. Mas como disse um representante evangélico ‘deve-se também à reação aos abusos de crianças cometidos pelos sacerdotes católicos em suas escolas, e cujo preço também nós, os evangélicos, pagamos qualificados também como culpados, sem ter a mesma culpa’. Uma espécie de ‘responsabilidade coletiva’”.
Outras fontes assinalam que o motivo principal da reação dos que se vão é que o Papa argentino, em vez de tomar uma medida necessária, isto é, deixar cessante o bispo Tebartz, por seu negócio de 31 milhões de euros para fazer melhorias na sua residência, deu-lhe um período de reflexão e descanso em um convento da Alemanha. No jornal Frankfurter Rundschau saiu um artigo em que o autor se dirige ao Papa: “Como é possível que você, que prega a humildade e a modéstia, pode agir assim condenando, pela dilapidação do dinheiro, o seu bispo a apenas um ‘descanso’ em um convento? Por que, em vez de enviá-lo de férias, não o enviou à África, a algum lugar isolado e abandonado por Deus para levar pão aos famintos? Sua atitude, senhor, me fez perder essa primeira impressão sobre você, como homem e como Papa”.

O fato é que os acontecimentos ficaram ainda mais conturbados depois das declarações do reitor da escola papal de sacerdotes Anima de Roma, Franz Xaver Brandmayr, que depois da conversa do Papa com o bispo acusado, assinalou: “Foi uma conversa em que houve compreensão e empenho das duas partes de chegar a uma solução e esclarecimento dos fatos. E o bispo Tebartz von Elst está disposto a voltar à sua diocese”.

Enquanto isso, seguem os abandonos de membros das ordens católicas. Segundo o próprio Vaticano, por ano, abandonam suas ordens 3.000 membros. O mesmo ocorre com as congregações femininas, que em dez anos viram seus efetivos se reduzirem de 792.100 para 713.000. Números que falam por si.

O positivo de tudo isso é que começou a discussão interna em uma das religiões mais difundidas pelo mundo, a católica. Mas, claro, não é o principal problema. A humanidade tem outros dramas que deve, irreversivelmente, discutir e solucionar. Um deles é a prostituição, isto é, o abuso do corpo da mulher. E outro é o trabalho infantil, que inclui “a fome de nossas crianças”. Um tema tão urgente e tão dissimulado pelos poderes dominantes do mundo. Justamente aqui, na Alemanha, começou a discussão: proibir ou não proibir a prostituição. Começou com o projeto apresentado por um grupo de notáveis que pedem a abolição para sempre da prostituição. É um tema difícil. Começou o debate. Muitos intelectuais sustentam que a mulher deve ser dona de seu próprio corpo. O que se deve proibir e perseguir são as organizações ou indivíduos que escravizam a mulher obtendo lucros do produto do negócio do sexo. Uma discussão que vem de séculos e que tem a ver com a vigilância policial, que também durante séculos simulou vigiar, mas que é parte do negócio.

A sociedade deve aconselhar e proteger a mulher. Convencer de que a prostituição é uma profissão pouco digna. Porque se coloca em jogo nada menos que o corpo feminino que a natureza dotou para o amor, a beleza e a maternidade. Mas, é possível isso em um mundo de violências? Basta ler esta informação: “Todos os anos 7,3 milhões de crianças e jovens menores de 18 anos dão à luz a um filho. Dois milhões delas são menores de 14 anos.” A informação é do relatório do Fundo Populacional das Nações Unidas (Unepa). Isto traz problemas físicos e sociais. Sim, 60.000 crianças morrem no mundo todos os anos por complicações ao dar à luz ou por complicações na gravidez. Quase todas essas gravidezes provêm de abusos sexuais. Realizados pelo homem. Claro, é muito ilusório pensar que permitindo a prostituição iria diminuir a violação de adolescentes. Mas é um argumento dos que promovem a prostituição livre, sem intermediários, para solucionar as necessidades masculinas. Sem permitir a escravidão de mulheres por organizações criminosas que promovem a prostituição por meio da violência, provocando assim a escravidão verdadeira dessas mulheres escravizadas com esse ofício. Um tema a ser discutido. O que é indiscutível é castigar qualquer instituição que promove a prostituição escravizando as mulheres.

E como ponto final desta nota, uma vergonha a mais do ser chamado humano: o trabalho infantil. Por exemplo, na Índia, trabalham na indústria da pedra nada mais nada menos que 150.000 crianças. Na Bolívia, atualmente, há um milhão de crianças trabalhando. No Brasil, quatro milhões de crianças que são obrigadas a trabalhar. A lista é interminável. O sistema que domina o mundo não foi capaz sequer de ver com olhos humanos as crianças. O homem permite que a criança seja explorada para obter mais lucros. Verdades que enchem de tristeza. Nem as religiões, nem as organizações internacionais, nem o ser humano em geral foi capaz de procurar uma infância feliz para todas as crianças do mundo. Viramos a página aqui. Para guardar, pelo menos, um pouco de esperança. Porque algo se move.