Sábado, 16 de novembro de 2013
Efeito Francisco faz a ''marca'' católica ir pelos ares
Como ele conseguiu inverter em
sentido positivo, em apenas poucos meses, uma imagem deturpada e até
mesmo irremediavelmente comprometida a ponto de fazê-la se tornar a
marca mais forte do mercado global? É quase uma blasfêmia falar assim da
Igreja Católica. No entanto, comunicadores, especialistas em marketing,
magos do branding estão estudando com atenção o fenômeno Francisco. Com a sua ótica profissional e buscando tirar lições úteis para o seu trabalho.
A reportagem é de Guido Moltedo, publicada no jornal Il Fatto Quotidiano, 14-11-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Certamente, a missão do papa tem a ver com Deus, não com uma marca. Mas a Igreja de Roma
também é uma organização de porte planetário, com 1,2 bilhão de fiéis e
mais de 400 mil padres. Além da sua longa história milenar, ela tem uma
geografia sem fronteiras, com ramificações territoriais e locais
extensas e profundas em todas as partes do mundo (2.795 dioceses).
Além disso, ela também é a maior "empresa", certamente sem fins
lucrativos, e não tem nada a aprender com as multinacionais mais fortes
que proliferam sobre o lucro. No entanto, há poucos meses, o seu "centro
de decisão" tinha chegado à beira da falência, econômica mas também
moral. Se, depois, isso realmente teria acontecido, a falência – se
tivesse sido eleito outro papa, diferente do Papa Bergoglio
–, ou se ele teria acelerado a corrida rumo ao precipício, não se sabe.
Mas, enquanto isso, com o papa que veio do "fim do mundo", a Igreja
está conhecendo um verdadeiro "boom".
Poucos dias depois da sua eleição, que ocorreu para a surpresa geral no dia 13 de março, Francisco
tinha subido ao status de estrela internacional, empurrando para o
esquecimento temas que tinham ocupado obsessivamente a mídia até os
últimos dias do pontificado de Bento XVI, dos padres
pedófilos às facas que voavam dentro da Cúria. Não era preciso um
especialista em comunicação para perceber – por exemplo – que uma
agência de imprensa internacional como a Reuters colocou apenas no quarto parágrafo de uma nota dedicada ao novo papa as referências ao escândalo do Vatileaks e aos confrontos dentro do Vaticano, enquanto o lead falava do intenso programa de Francisco
em vista da Páscoa e a sua recomendação dirigida aos padres para que se
dedicassem a ajudar os pobres e os sofredores, em vez de se ocuparem
com as suas carreiras de "administradores" da Igreja.
Não devemos esquecer o compromisso solitário e corajoso de Bento XVI contra a "sujeira" na Igreja. No entanto, o próprio papa alemão acabou parecendo ser "o problema". Francisco, hoje, é considerado "a solução", como escreveu Damian Thompson, no The Telegraph, em um artigo intitulado "O Papa Francisco descontaminou a marca católica?".
O que chamou a atenção de Thomson, como muitos outros vaticanistas e especialistas do mundo católico, foram acima de tudo os números. Os três milhões de Copacabana. As multidões de São Pedro que já chegam ao longo do RioTibre. Os 10 milhões de seguidores no Twitter.
O infinito número de buscas no Google. Especialmente mais fiéis nas
Igrejas. Mais fiéis nos confessionários. Mais praticantes que fazem a
comunhão. É o chamado "Francis effect", como escrevem o Guardian e o Washington Post, retomando uma pesquisa realizada pelo Cesnur sobre o efeito Francesco.
De acordo com um especialista em marketing, o Papa Francisco demonstra que "leading by example",
liderar pelo exemplo, é uma chave decisiva para a afirmação de uma
"marca". E é isso que ele faz continuamente. A foto do abraço e do beijo
ao Elephant Man instantaneamente se tornou "viral". "Diabos, até mesmo os ateus o amam", quase exulta a CNN
registrando o grande número de tuítes de não crentes e o sucesso de um
debate online sobre a capacidade real desse papa de "conectar-se" com as
pessoas que sofrem.
A chave do seu sucesso? Simples: o seu esforço constante voltado a
incluir no discurso atual principalmente as pessoas normais – os muitos
fiéis que lidam com os problemas de hoje, morais e práticos – que
justamente se sentiam não desejadas como parte do rebanho, porque a
atenção era voltada aos fiéis "regulares" (ou aos seguidores de
movimentos eclesiais).
Quem se mistura na multidão das quartas-feiras ou dos domingos no
Angelus vê pessoas e famílias absolutamente "normais", que são a maioria
do povo católico, mas que não se sentiam em conexão com a Igreja de Bento XVI. Como escreveu Vito Mancuso no La Repubblica, o que está em jogo na ação do Papa Francisco "é o direito de todos os batizados de ter uma Igreja simplesmente normal".
Entre os fãs do Papa Bergoglio certamente estão os "cafeteria Catholics", como os define Damian Thompson, e os não crentes. Melhor assim, diria Francisco. Além disso, no entanto, não se trata de proselitismo ("Uma solene bobagem", como ele definiu na sua conversa com Eugenio Scalfari),
mas sim o efeito de uma ação mais clarividente, que tem no seu centro a
redefinição do próprio papado e da organização da Igreja em uma
perspectiva de longa duração.
Nisso, Bergoglio é realmente um papa, e não o CEO de
uma multinacional, que, embora os seus interesses sejam grandes, não
tem milênios atrás de si e milênios à sua frente. É um "agente de
mudança" dentro de uma organização que parecia incapaz de mudar e
parecia ser intrínseca e irremediavelmente conservadora e refém dos
conservadores.
Sim, os conservadores. Como observa Thompson ainda,
"para a Igreja, uma coisa é enfrentar a hostilidade por desafiar estilos
de vida confortáveis e da moda; outra coisa bem diferente é se tornar
sinônimo do mal. Se o Papa Francisco
pode criar uma atmosfera na qual os católicos são julgados pelas suas
ações hoje, ao invés dos crimes abomináveis cometidos por uma minoria do
seu clero, então até mesmo o tradicionalista mais devoto lhe será
devedor".