Corrida presidencial
Candidatos à Presidência defendem reformas que podem não sair do papel
Para cientistas políticos, muitas propostas dos presidenciáveis são meros elementos de marketing para tentar convencer o eleitor
- 18/07/2014, 00:21
- Chico Marés
- Roberto Ghement/Efe
- Congresso Nacional: a reforma política é defendida por praticamente todos os candidatos à Presidência, mas ela nunca é efetivada pelo Legislativo
Presente no cenário político brasileiro desde as reformas de base
prometidas pelo presidente João Goulart, a ideia de reformar o Estado
está presente nos programas dos quatro principais candidatos à
Presidência. A reforma política é citada nos quatro programas, e outras
reformas, como a tributária e a “dos serviços públicos”, também aparecem
nas propostas. Entretanto, pode se tratar de um mero elemento de
retórica, já que muitas das propostas são genéricas e pouco
aprofundadas.
Para Roberto Romano, professor de Filosofia Política da Unicamp, a
ideia de reforma serve como uma espécie de “termo embreagem” para os
candidatos. Esse conceito, elaborado pelo linguista francês Émile
Benveniste, remete a uma palavra que nada significa, mas que torna o
discurso mais facilmente digerível. No entendimento de Romano, as
reformas sugeridas pelos candidatos são pouco consistentes, mais
próximas de uma estratégia de marketing.
Um exemplo seria a reforma política. Para Romano, ela só seria
possível com a democratização dos partidos, o que não aparece nas
propostas. Entretanto, todos os candidatos prometem que ela será
realizada. Logo, para Romano, as mudanças sugeridas pelos candidatos não
têm um caráter de fato reformista – no máximo, o termo serve como um
elemento de propaganda.
Já o cientista político do grupo Uninter Luiz Domingos Costa aponta
que os planos de governo tendem a ser exageradamente abrangentes. “Um
candidato à Presidência tem que agradar a muitos segmentos para ser
competitivo, então precisa incluir muitas opções em seu programa. O
eleitorado cobra mais pela ausência de temas do que pela presença”,
afirma. Logo, há a necessidade de se incluir reformas que não
necessariamente estarão na lista de prioridades do candidato vencedor.
Costa diz que a ideia de reforma tem um apelo positivo entre
segmentos da população de classe média e alta, e acredita que as
reformas política e tributária terão certo destaque durante os debates
da campanha. Ainda assim, ele acha improvável que esses temas sejam
fatores decisivos na eleição, já que o eleitorado médio tende a dar mais
atenção a propostas palpáveis, como a redução do desemprego ou a
execução de obras, do que a mudanças no modo de organização do Estado.
Reformas
O PT governou o país pelos últimos 11 anos e meio. Ainda assim, se o
programa de governo da presidente Dilma Rousseff (PT), candidata à
reeleição, defende a realização de quatro reformas para “o novo ciclo
histórico” que propõe: política, urbana, federativa e dos serviços
públicos. Principal partido de oposição, o PSDB defende uma reforma a
mais: além da política e dos serviços públicos, o programa de Aécio
Neves (PSDB) cita a reforma tributária, da infraestrutura, da segurança
pública.
Já Eduardo Campos (PSB) coloca a reforma política como o primeiro
item de seu plano de governo, e cita também a reforma tributária e da
administração pública, além de um “novo federalismo”. Pastor Everaldo
(PSC) dá destaque em seu programa para as reformas política e
tributária. Ele fala também em uma reforma trabalhista, na assistência
social e no setor bancário.
Mudanças no sistema político são resposta a protestos
A ideia de levar adiante uma reforma política foi a principal
resposta da classe política aos protestos de junho de 2013 – ainda que
essa não tenha sido a única, ou mesmo a mais importante, das demandas. A
presidente Dilma Rousseff (PT) chegou a apresentar uma proposta de
Constituinte exclusiva, que ainda é defendida pelo PT, e de um
plebiscito para que a população opinasse sobre o tema. As propostas não
foram adiante no Congresso.
O assunto não chega a ser uma novidade: em 2007, um projeto de lei
foi relatado pelo deputado Ronaldo Caiado (DEM-GO), mas acabou
arquivado. Entre 2011 e 2013, comissões na Câmara e no Senado discutiram
o tema, mas ambas acabaram morrendo na praia. O insucesso ocorreu,
principalmente, pela falta de consenso sobre os mais variados temas por
parte dos deputados e senadores.
Para o cientista político Luiz Domingos Costa, do grupo Uninter,
ainda que o tema não seja uma novidade, apenas no ano passado a ideia de
reforma política ganhou destaque na opinião pública. Logo, o tema pode
ter um peso importante na campanha, sem que haja um risco de soar como
uma promessa velha.
Outras reformas
Entre os candidatos de oposição, outra reforma destacada é a
tributária. Todos os candidatos defendem a simplificação do sistema
tributário. Eduardo Campos (PSB) fala também em assegurar mais autonomia
a estados e municípios, enquanto Pastor Everaldo (PSC) defende o corte
linear de impostos.
O cientista político Luiz Domingos Costa aponta que a ideia de que a
carga tributária no Brasil é alta virou um “senso comum” e que a
diminuição da carga de impostos tende a ser uma proposta popular nas
classes média e alta.
Outras questões que não chegam bem a ser reformas acabam ganhando
esse título para se tornarem mais palatáveis ao eleitor. É o caso da
“reforma dos serviços públicos”, que não trata de um conjunto de
mudanças de ordem legal – como a reforma política, tributária ou outras
reformas já realizadas, como a previdenciária – e, sim, um aprimoramento
da gestão dos serviços sociais no país.
Qual reforma?
Depois dos protestos de junho do ano passado, virou quase consensual a defesa de uma reforma política. Seis candidatos incluíram esse tema em seu programa de governo. Saiba o que defendem:• Dilma Rousseff (PT): o programa de governo fala de distorções no sistema político, mas não
especifica quais. O documento diz que a reforma deve partir de um plebiscito popular. O PT defende o fim do financiamento privado de campanha e a adoção de listas fechadas – ainda que não isso não seja citado no programa de governo.
• Aécio Neves (PSDB): assim como o PT, o PSDB fala na necessidade da reforma política para “tornar mais confiável e transparente” a representação política no país, mas não especifica posicionamentos. Internamente, o partido defende o voto distrital misto e o fim da reeleição – aprovada durante a gestão tucana, em 1998 – e das coligações em eleições proporcionais.
• Eduardo Campos (PSB): entre os quatro principais candidatos, é o que mais especifica suas propostas sobre o tema. O PSB defende o barateamento das campanhas (sem especificar se permitindo ou não o financiamento privado), a possibilidade de candidaturas avulsas e o aperfeiçoamento de instrumentos de democracia direta, entre outros pontos.
• Pastor Everaldo (PSC): apresenta três propostas: o fim do voto obrigatório, a criação de um sistema de impressão do voto para eventuais recontagens e a simplificação da burocracia para o registro de candidaturas.
• Eduardo Jorge (PV): propõe a redução dos salários e do número de deputados federais e estaduais, a extinção do Senado, o fim do voto obrigatório e um novo plebiscito para que a população possa optar ou não pelo parlamentarismo. O partido defende também o voto distrital misto.
• Luciana Genro (PSol): é contrária ao financiamento privado de campanhas e defende uma maior participação de “setores historicamente alijados” da política.