Roberto Ghement/Efe
Congresso Nacional: a reforma política é
defendida por praticamente todos os candidatos à Presidência, mas ela
nunca é efetivada pelo Legislativo
Candidatos à Presidência defendem reformas que podem não sair do papel
Para cientistas políticos, muitas propostas dos presidenciáveis são meros elementos de marketing para tentar convencer o eleitor
Presente no cenário político brasileiro desde as reformas de base
prometidas pelo presidente João Goulart, a ideia de reformar o Estado
está presente nos programas dos quatro principais candidatos à
Presidência. A reforma política é citada nos quatro programas, e outras
reformas, como a tributária e a “dos serviços públicos”, também aparecem
nas propostas. Entretanto, pode se tratar de um mero elemento de
retórica, já que muitas das propostas são genéricas e pouco
aprofundadas.
Para Roberto Romano, professor de Filosofia
Política da Unicamp, a ideia de reforma serve como uma espécie de “termo
embreagem” para os candidatos. Esse conceito, elaborado pelo linguista
francês Émile Benveniste, remete a uma palavra que nada significa, mas
que torna o discurso mais facilmente digerível. No entendimento de
Romano, as reformas sugeridas pelos candidatos são pouco consistentes,
mais próximas de uma estratégia de marketing.
Qual reforma?
Depois dos protestos de junho do ano passado, virou quase consensual a defesa de uma reforma política. Seis candidatos incluíram esse tema em seu programa de governo. Saiba o que defendem:• Dilma Rousseff (PT): o programa de governo fala de distorções no sistema político, mas não especifica quais. O documento diz que a reforma deve partir de um plebiscito popular. O PT defende o fim do financiamento privado de campanha e a adoção de listas fechadas – ainda que não isso não seja citado no programa de governo.
• Aécio Neves (PSDB): assim como o PT, o PSDB fala na necessidade da reforma política para “tornar mais confiável e transparente” a representação política no país, mas não especifica posicionamentos. Internamente, o partido defende o voto distrital misto e o fim da reeleição – aprovada durante a gestão tucana, em 1998 – e das coligações em eleições proporcionais.
• Eduardo Campos (PSB): entre os quatro principais candidatos, é o que mais especifica suas propostas sobre o tema. O PSB defende o barateamento das campanhas (sem especificar se permitindo ou não o financiamento privado), a possibilidade de candidaturas avulsas e o aperfeiçoamento de instrumentos de democracia direta, entre outros pontos.
• Pastor Everaldo (PSC): apresenta três propostas: o fim do voto obrigatório, a criação de um sistema de impressão do voto para eventuais recontagens e a simplificação da burocracia para o registro de candidaturas.
• Eduardo Jorge (PV): propõe a redução dos salários e do número de deputados federais e estaduais, a extinção do Senado, o fim do voto obrigatório e um novo plebiscito para que a população possa optar ou não pelo parlamentarismo. O partido defende também o voto distrital misto.
• Luciana Genro (PSol): é contrária ao financiamento privado de campanhas e defende uma maior participação de “setores historicamente alijados” da política.
Um exemplo seria a reforma política. Para Romano, ela só
seria possível com a democratização dos partidos, o que não aparece nas
propostas. Entretanto, todos os candidatos prometem que ela será
realizada. Logo, para Romano, as mudanças sugeridas pelos candidatos não
têm um caráter de fato reformista – no máximo, o termo serve como um
elemento de propaganda.
Já o cientista político do grupo Uninter Luiz Domingos Costa aponta
que os planos de governo tendem a ser exageradamente abrangentes. “Um
candidato à Presidência tem que agradar a muitos segmentos para ser
competitivo, então precisa incluir muitas opções em seu programa. O
eleitorado cobra mais pela ausência de temas do que pela presença”,
afirma. Logo, há a necessidade de se incluir reformas que não
necessariamente estarão na lista de prioridades do candidato vencedor.
Costa diz que a ideia de reforma tem um apelo positivo entre
segmentos da população de classe média e alta, e acredita que as
reformas política e tributária terão certo destaque durante os debates
da campanha. Ainda assim, ele acha improvável que esses temas sejam
fatores decisivos na eleição, já que o eleitorado médio tende a dar mais
atenção a propostas palpáveis, como a redução do desemprego ou a
execução de obras, do que a mudanças no modo de organização do Estado.
Reformas
O PT governou o país pelos últimos 11 anos e meio. Ainda assim, se o
programa de governo da presidente Dilma Rousseff (PT), candidata à
reeleição, defende a realização de quatro reformas para “o novo ciclo
histórico” que propõe: política, urbana, federativa e dos serviços
públicos. Principal partido de oposição, o PSDB defende uma reforma a
mais: além da política e dos serviços públicos, o programa de Aécio
Neves (PSDB) cita a reforma tributária, da infraestrutura, da segurança
pública.
Já Eduardo Campos (PSB) coloca a reforma política como o primeiro
item de seu plano de governo, e cita também a reforma tributária e da
administração pública, além de um “novo federalismo”. Pastor Everaldo
(PSC) dá destaque em seu programa para as reformas política e
tributária. Ele fala também em uma reforma trabalhista, na assistência
social e no setor bancário.
Mudanças no sistema político são resposta a protestos
A ideia de levar adiante uma reforma política foi a principal
resposta da classe política aos protestos de junho de 2013 – ainda que
essa não tenha sido a única, ou mesmo a mais importante, das demandas. A
presidente Dilma Rousseff (PT) chegou a apresentar uma proposta de
Constituinte exclusiva, que ainda é defendida pelo PT, e de um
plebiscito para que a população opinasse sobre o tema. As propostas não
foram adiante no Congresso.
O assunto não chega a ser uma novidade: em 2007, um projeto de lei
foi relatado pelo deputado Ronaldo Caiado (DEM-GO), mas acabou
arquivado. Entre 2011 e 2013, comissões na Câmara e no Senado discutiram
o tema, mas ambas acabaram morrendo na praia. O insucesso ocorreu,
principalmente, pela falta de consenso sobre os mais variados temas por
parte dos deputados e senadores.
Para o cientista político Luiz Domingos Costa, do grupo Uninter,
ainda que o tema não seja uma novidade, apenas no ano passado a ideia de
reforma política ganhou destaque na opinião pública. Logo, o tema pode
ter um peso importante na campanha, sem que haja um risco de soar como
uma promessa velha.
Outras reformas
Entre os candidatos de oposição, outra reforma destacada é a
tributária. Todos os candidatos defendem a simplificação do sistema
tributário. Eduardo Campos (PSB) fala também em assegurar mais autonomia
a estados e municípios, enquanto Pastor Everaldo (PSC) defende o corte
linear de impostos.
O cientista político Luiz Domingos Costa aponta que a ideia de que a
carga tributária no Brasil é alta virou um “senso comum” e que a
diminuição da carga de impostos tende a ser uma proposta popular nas
classes média e alta.
Outras questões que não chegam bem a ser reformas acabam ganhando
esse título para se tornarem mais palatáveis ao eleitor. É o caso da
“reforma dos serviços públicos”, que não trata de um conjunto de
mudanças de ordem legal – como a reforma política, tributária ou outras
reformas já realizadas, como a previdenciária – e, sim, um aprimoramento
da gestão dos serviços sociais no país.