Prisão de ativistas só serve para saciar a fome de vingança de setores raivosos
O Brasil é hoje o terceiro país no mundo que mais possui encarcerados,
perdendo apenas para a China e os Estado Unidos. Esse número não nos
deixa em boa posição em um cenário de civilização que promoveu diversas
revoluções na conquista das liberdades. Nossa pátria já traz tatuada em
sua história a marca de ser o último país da América a abolir a
escravidão.
Ainda não nos desapegamos dessa prática hedionda.
Trocamos o tronco e os castigos físicos, além da exclusão social em
razão da cor da pele, pelo encarceramento como forma de manter acesa a
chama do apartheid social.
Apesar do reconhecimento do fracasso
do sistema penitenciário brasileiro como forma de ressocialização, ainda
é muito grande o número de pessoas encarceradas desnecessariamente
quando existem alternativas de reparação dos danos que a criminalidade
causa à sociedade, além da violência oriunda dos cárceres.
Trocamos o tronco e os castigos físicos, além da exclusão social em razão da cor da pele, pelo encarceramento como forma de manter acesa a chama do apartheid social desembargador do Tribunal de Justiça e Coordenador-Rio da Associação Juízes para a Democracia, sobre o sistema prisional brasileiro
O dispêndio inútil de recursos para aprisionar poderia e deveria ser
destinado para a construção de uma sociedade mais justa, que priorizasse
a educação e saúde do nosso povo. Reformas legais têm sido feitas, mas
não houve o desapego de juízes e membros do Ministério Público ao
sistema de privação de liberdade.
Alternativas não faltam às
medidas privativas de liberdade, tais como as diversas medidas
cautelares, a prisão domiciliar e as penas alternativas.
O custo
social e financeiro do encarceramento é muito elevado, e retira do
administrador público a oportunidade de direcionar tais recursos para um
combate mais eficaz da criminalidade, como a construção de escolas e
universidades, o saneamento básico de comunidades pobres e o implemento
de políticas públicas que privilegiem as pessoas mais vulneráveis, como
crianças, idosos e pobres.
Hoje o sistema penitenciário tem sido
habitado prioritariamente pela criminalidade relacionada com o tráfico
de drogas. Há países que estão experimentando modalidades diversas de
combate às drogas, que não esse sistema proibicionista, que tem
provocado tantas mortes de agentes de segurança pública, de criminosos
e, sobretudo, de inocentes.
Enquanto houver alternativas diversas da privação da liberdade, essas devem prevalecer sobre o encarceramento desembargador do Tribunal de Justiça e Coordenador-Rio da Associação Juízes para a Democracia, sobre outras formas de punição por crimes e contravenções
A descriminalização do comércio de drogas e seu controle pelo poder
público, além de um sistema eficiente de tratamento de saúde dos
usuários e vítimas das drogas, tem se mostrado mais eficaz que o atual
sistema, responsável por quase 70% dos prisioneiros.
A
Constituição preserva a liberdade como um bem fundamental a ser
preservado, e a sua restrição se dá apenas em casos excepcionais e
devidamente fundamentados pela autoridade judiciária competente.
Enquanto houver alternativas para privação da liberdade, essas devem
prevalecer sobre o encarceramento. Apesar dessa regra maior, tem sido
uma prática a internação de jovens envolvidos com o tráfico de
entorpecentes, mesmo que não se trate de "ato infracional cometido
mediante grave ameaça ou violência à pessoa", o que viola expresso texto
legal.
Nesse contexto, a denúncia do Ministério Público -
embora a mídia interessada em subtrair a verdade do público tenha
noticiado incêndios, lesões corporais, danos ao patrimônio público e
porte de explosivos, dentre outros delitos - é exclusivamente pelo
delito de quadrilha armada (artigo 288, parágrafo único do Código Penal,
cuja pena pode variar entre um e três anos de reclusão, podendo ser
dobrada).
Ora, ainda que os acusados venham a ser condenados, na
pior das hipóteses a pena não ultrapassará dois anos, pois são réus
primários e de bons antecedentes. Sabe-se que, pela nossa legislação, a
condenação até quatro anos pode e deve ser substituída por penas
alternativas em liberdade.
A Constituição Federal preserva a liberdade como um bem fundamental a ser preservado, e a sua restrição se dá apenas em casos excepcionais
Assim sendo, o que justifica manter presas pessoas que, ainda que condenadas, permanecerão em liberdade?
Prejuízo maior terá a sociedade se tais pessoas vierem posteriormente
acionar o Estado para que paguemos, com os tributos que nos são
cobrados, indenizações por terem sido presas ilegalmente apenas para
saciar a "fome de vingança" de setores raivosos, incapazes de raciocinar
além do noticiário indutivo.
No caso concreto, acrescente-se
ainda que o próprio Ministério Público, fiscal da lei e principal
defensor da sociedade, afirmou expressamente nos autos de processo
contra dois dos acusados que "os indiciados não representam qualquer
perigo para a ordem pública, entende o Parquet - membro do Ministério
Público - que não se encontram presentes os requisitos autorizadores da
manutenção da custódia cautelar dos indiciados"."O Ministério Público é
pelo deferimento do pleito libertário formulado em favor dos indiciados
CARJ e IPD`I", diz Paulo José Sally, promotor de Justiça.
Eis as
razões pelas quais as medidas cautelares aplicadas estão mais em
conformidade com a Constituição, as leis e a jurisprudência dos
tribunais, salvo melhor entendimento.