segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Blog do Noblat

Enviado por Ricardo Noblat -
17.8.2009
|
8h03m
Comentário

O apagão de Dilma

Em que estado se encontravam as lamparinas do juízo da ministra Dilma Rousseff quando ela negou o encontro que teve no final do ano passado no Palácio do Planalto com a então secretária da Receita Federal Lina Vieira?

Não teria sido mais fácil confirmar o encontro e negar o que Lina disse ter ouvido dela? Ou afirmar que fora mal entendida?

Lina contou à Folha de S. Paulo que fora chamada para uma reunião com Dilma. O portador do convite – ou da convocação, se preferirem – não foi ninguém menos que Erenice Guerra, secretária-executiva da Casa Civil.

Inusitado que tenha sido Erenice. Ela é importante demais para sair dos seus domínios e se ocupar com tarefa tão prosaica.

Mas por inusitado, parece crível. Erenice não discute ordens de Dilma. Está ali para fazer o que ela manda. O resto da equipe da Casa Civil, também.

Alguns assessores veneram a ministra. A maioria teme seus ataques de cólera. O chefe do Gabinete de Segurança da Presidência, general Jorge Armando Felix, já foi alvo de um deles. Inesquecível!

Lina revelou ter ouvido de Dilma a recomendação para que apressasse as investigações em torno dos negócios suspeitos do empresário Fernando Sarney, filho do senador José Sarney (PMDB-AP).

A Polícia Federal chegou a pedir a prisão dele, recusada por um juiz do Maranhão. Lina foi embora do gabinete de Dilma e não falou mais com ela sobre o assunto.

A assessoria da ministra negou tudo – o encontro e a conversa sobre Fernando Sarney. No dia seguinte foi a própria ministra que negou. E voltou a negar mais duas vezes.

Fala, Lina: "Ela me perguntou se eu podia agilizar a fiscalização do filho do Sarney. Fui embora e não dei retorno. Acho que eles não queriam problema com o Sarney."

Fala, Dilma: "Eu não fiz esse pedido. Olha, eu encontrei com a secretária da Receita várias vezes, com outras pessoas junto, em grandes reuniões. Essa reunião privada a que ela se refere, eu não tive com ela."

Fala de novo, Lina: "Ela sabe que eu estive lá e sabe que falou comigo. Não custava nada ela ter dito a verdade."

Vai na bola, Dilma: “Há coisas que a gente não afirma; a gente prova. Não vou fazer avaliação subjetiva quanto a interesses de ninguém”.

Devolve a bola, Lina: “Qual a dificuldade [de a ministra admitir o encontro]? Na minha biografia não existe mentira”.

Por sua vez, Erenice negou ter sido portadora de convite para que Lina se reunisse com Dilma.

Erenice falou por meio de nota oficial: “A secretária-executiva da Casa Civil da presidência da República afirma que jamais esteve no gabinete de trabalho da ex-secretaria da Receita Federal Lina Vieira”.

Rebateu de viva voz Iraneth Dias, ex-chefe de gabinete de Lina: “Eu confirmo que ela esteve aqui e que a secretária falou que iria ao palácio”.

Quem fala a verdade?

É o que quer saber a Comissão de Constituição e Justiça do Senado. Ela convidou Lina para depor amanhã.

Lina pediu passagem e hospedagem para voltar a Brasília. Está de repouso numa praia. Alguns senadores querem ouvir também Dilma e, se possível, acareá-la com Lina. Nem pensar, retruca o governo.

Seria muito fácil para o governo provar que a verdade está do lado de Dilma e Erenice.

Ninguém entra no palácio sem ser identificado.

Nenhum carro estaciona ali sem ter a placa anotada.

Ninguém circula pelos corredores a salvo de câmeras de televisão.

Depois de consultar seus arquivos por que o governo não disse simplesmente que Lina mentiu?

De duas, uma: não disse porque Lina falou a verdade. Ou porque o apagão nas lamparinas do juízo de Dilma o deixou sem saída. Recolheu-se ao silêncio obsequioso.

De resto, Dilma já mentiu em outras ocasiões.

Disse, por exemplo, que era mestre e doutoranda pela Universidade de Campinas – falso.

Disse que não participou da luta armada contra a ditadura de 64 – falso.

Disse que o governo não fez dossiê sobre despesas sigilosas do governo Fernando Henrique – nada mais falso.