Não fechem Guantánamo
Para maioria dos detidos na base, fim da prisão significará transferência para locais onde terão ainda menos direitos
15 de janeiro de 2013 | 2h 11
Jennifer Daskal - The New York Times - O Estado de S.Paulo
Em 2010, fui rotulada de membro da "Al-Qaeda 7", como
eram estigmatizados os advogados do Departamento de Justiça,
ridicularizados pelos críticos por "correrem em massa para Guantánamo
para defender os terroristas", como diziam. Meu crime foi defender o
fechamento da prisão - posição também assumida pelo ex-presidente George
W. Bush, pelo ex-secretário da Defesa Robert Gates e pelo ex-secretário
de Estado Colin Powell - e condições de vida mais humanas para os
presos.
Na época, reagi e tratei de me defender. Estava indignada. Insisti na
legitimidade das minhas convicções. Mas, mesmo então, era fácil prever o
que ocorreria. Para o grupo de detidos mais importante, o fechamento de
Guantánamo não significaria a liberdade ou a possibilidade de responder
a processo, como a maioria das organizações de defesa dos direitos
humanos e de liberdades civis pedem há muito. Ao contrário, significaria
a transferência para outro cárcere, nos EUA ou em outro país, onde
continuariam detidos.
Agora, quase quatro anos depois, mudei de opinião. Mesmo reconhecendo
os vários imperativos políticos a favor do fechamento da prisão, apesar
do apoio de ambos os partidos a essa posição e a despeito do fato de
166 homens ainda padecerem lá, agora acredito que Guantánamo deve
permanecer aberta - pelo menos por enquanto.
Embora tenha demorado a me convencer disso, os sinais já eram
evidentes há algum tempo. Há três anos, o governo de Barack Obama
realizou um amplo exame da situação dos detidos e concluiu que cerca de
40 não podem ser processados, mas são perigosos demais para serem
transferidos ou soltos. Eles ainda são mantidos na prisão de acordo com
as leis marciais que permitem a detenção sem acusação formal por toda a
duração das hostilidades.
Outros são do Iêmen. Embora muitos atendam às condições para serem
transferidos, a transferência foi adiada por tempo indefinido diante da
instabilidade no país. Teme-se pela incapacidade do Iêmen em implementar
medidas de segurança adequadas e pelo risco de que alguns entrem na
Al-Qaeda.
Ainda que os números tenham mudado com o tempo, as categorias
permanecem. Eles são homens que o atual governo não pretende transferir,
libertar ou processar, enquanto a autoridade legal para detê-los, em
razão da lei militar, perdurar.
Obama alimentou as esperanças dos grupos de defesa dos direitos
humanos quando, na campanha para a reeleição, mais uma vez, afirmou que o
centro de detenção seria fechado. Não ficou claro, porém, se ele tinha
um plano viável e se a estratégia envolveria a transferência de muitos
dos detidos para os EUA, onde suas condições de vida, muito
provavelmente, piorariam.
Evolução. A Guantánamo de 2013 não é mais a Guantánamo de 2002.
Graças aos grupos de direitos humanos, aos observadores internacionais e
aos advogados dos detidos, houve uma melhoria significativa, embora não
uniforme, de suas condições. A maioria dos presos agora vive em
instalações comunitárias onde podem comer, orar e exercitar-se juntos.
Se forem transferidos para os EUA, provavelmente, teriam de
permanecer em prisões militares em condições semelhantes às das prisões
de segurança máxima - confinados a suas celas 22 horas por dia e
proibidos de participar de atividades em grupo, inclusive a oração. As
melhorias conseguidas a duras penas voltariam ao nível anterior de
brutalidade de cinco anos atrás.
E Guantánamo não seria mais a experiência fracassada numa ilha a
muitos quilômetros de distância. O governo Obama estaria criando um novo
sistema de detenção sem acusação para os suspeitos de terrorismo em
solo americano, estabelecendo um precedente e criando uma instalação
disponível para os futuros presidentes que quisessem se livrar de
indivíduos potencialmente perigosos.
A realidade política é que o fechamento de Guantánamo não deverá
ocorrer tão cedo e, se vier, suas consequências serão mais negativas do
que positivas. Ao contrário, devemos procurar lugares para transferir os
que forem inocentados e possam sair da prisão e, o que é mais
importante, definir o fim da guerra.
Num recente discurso, Jeh Johnson, na época consultor jurídico do
Departamento da Defesa, discutiu uma futura guinada histórica na qual a
Al-Qaeda será tão dizimada que o conflito armado será encerrado. As
declarações de funcionários de alto escalão sugerem que esse momento
pode estar próximo. E, como os EUA se preparam para deixar o
Afeganistão, há mais uma forte premissa para considerar a guerra próxima
do fim. Assim, a justificativa legal para as detenções desaparecerá.
A esta altura, os homens que permanecem em Guantánamo não podem
continuar na prisão sem acusação formal, pelo menos sem entrar em
conflito com as proibições constitucionais básicas e do direito
internacional. Somente então será possível esperar um fechamento
definitivo, não recriando uma prisão nos EUA, mas mediante uma
trabalhosa transferência, libertação ou processo dos detidos que
continuam lá. Enquanto isso, devemos manter Guantánamo aberta.
/
TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA
* É PESQUISADORA DO GEORGETOWN LAW CENTER E FOI CONSELHEIRA DE CONTRATERRORISMO DA HUMAN RIGHT WATCH
Op-Ed Contributor
Don’t Close Guantánamo
By JENNIFER DASKAL
Published: January 10, 2013
WASHINGTON
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IN 2010, I was branded a member of the “Al Qaeda 7” — a notorious label attached to Department of Justice lawyers who were mocked by critics claiming they had “flocked to Guantánamo
to take up the cause of the terrorists.” My crime: I advocated for the
closure of the detention facility — a position that has also been taken
up by the likes of former President George W. Bush, former Secretary of
Defense Robert M. Gates and former Secretary of State Colin L. Powell —
and for more humane living conditions for those imprisoned there.
At the time, I reacted defensively. I was indignant. I insisted on the
legitimacy of my convictions. But even then the writing was on the wall.
For a core group of detainees, closing Guantánamo would not mean
release or prosecution, as most human rights and civil liberties groups
have long advocated. Rather, it would mean relocation to the United
States, or elsewhere, for continued detention.
Now, almost four years later, I have changed my mind. Despite
recognizing the many policy imperatives in favor of closure, despite the
bipartisan support for this position, and despite the fact that 166 men still languish there, I now believe that Guantánamo should stay open — at least for the short term.
While I have been slow to come to this realization, the signs have been
evident for some time. Three years ago, Barack Obama’s administration
conducted a comprehensive review of the Guantánamo detainees and
concluded that about four dozen prisoners couldn’t be prosecuted, but
were too dangerous to be transferred or released. They are still being
held under rules of war that allow detention without charge for the
duration of hostilities.
Others happened to hail from Yemen. Although many of them were cleared
for transfer, the transfers were put on indefinite hold because of
instability in Yemen, the fear that some might join Al Qaeda forces, and
Yemen’s inability to put adequate security measures in place.
While the specific numbers have most likely shifted over time, the basic
categories persist. These are men whom the current administration will
not transfer, release or prosecute, so long as the legal authority to
detain, pursuant to the law of war, endures.
President Obama raised the hopes of the human rights community when
during his re-election campaign he once again said the detention center
should be closed. But it was not clear whether he had a viable plan, and
any such plan would almost certainly involve moving many of the
detainees into continued detention in the United States, where their
living conditions would almost certainly deteriorate.
Guantánamo in 2013 is a far cry from Guantánamo in 2002. Thanks to the
spotlight placed on the facility by human rights groups, international
observers and detainees’ lawyers, there has been a significant, if not
uniform, improvement in conditions.
The majority of Guantánamo detainees now live in communal facilities
where they can eat, pray and exercise together. If moved to the United
States, these same men would most likely be held in military detention
in conditions akin to supermax prisons — confined to their cells 22
hours a day and prohibited from engaging in group activities, including
communal prayer. The hard-won improvements in conditions would be
ratcheted back half a decade to their previous level of harshness.
And Guantánamo would no longer be that failed experiment on an island
many miles away. The Obama administration would be affirmatively
creating a new system of detention without charge for terrorism suspects
on American soil, setting a precedent and creating a facility readily
available to future presidents wanting to rid themselves of a range of
potentially dangerous actors.
The political reality is that closure of Guantánamo is unlikely to
happen anytime soon, and if it did, it would do more harm than good. We
should instead focus on finding places to transfer those cleared to
leave the facility and, more important, on defining the end to the war.
In a recent speech, Jeh Johnson, then the Department of Defense general counsel, discussed
a future “tipping point” at which Al Qaeda would be so decimated that
the armed conflict would be deemed over. Statements from high level
officials suggest that this point may be near. And as the United States
pulls out of Afghanistan, there is an increasingly strong argument that
the war against Al Qaeda is coming to a close. With the end of the
conflict, the legal justification for the detentions will finally
disappear.
At that point, the remaining men in Guantánamo can no longer be held
without charge, at least not without running afoul of basic
constitutional and international law prohibitions. Only then is there a
realistic hope for meaningful closure, not by recreating a prison in the
United States but through the arduous process of transferring,
releasing or prosecuting the detainees left there.
In the meantime, we should keep Guantánamo open.