quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

O Estado de São Paulo e The New York Times.

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Não fechem Guantánamo

Para maioria dos detidos na base, fim da prisão significará transferência para locais onde terão ainda menos direitos

15 de janeiro de 2013 | 2h 11

Jennifer Daskal - The New York Times - O Estado de S.Paulo
 
Em 2010, fui rotulada de membro da "Al-Qaeda 7", como eram estigmatizados os advogados do Departamento de Justiça, ridicularizados pelos críticos por "correrem em massa para Guantánamo para defender os terroristas", como diziam. Meu crime foi defender o fechamento da prisão - posição também assumida pelo ex-presidente George W. Bush, pelo ex-secretário da Defesa Robert Gates e pelo ex-secretário de Estado Colin Powell - e condições de vida mais humanas para os presos. 

Na época, reagi e tratei de me defender. Estava indignada. Insisti na legitimidade das minhas convicções. Mas, mesmo então, era fácil prever o que ocorreria. Para o grupo de detidos mais importante, o fechamento de Guantánamo não significaria a liberdade ou a possibilidade de responder a processo, como a maioria das organizações de defesa dos direitos humanos e de liberdades civis pedem há muito. Ao contrário, significaria a transferência para outro cárcere, nos EUA ou em outro país, onde continuariam detidos. 

Agora, quase quatro anos depois, mudei de opinião. Mesmo reconhecendo os vários imperativos políticos a favor do fechamento da prisão, apesar do apoio de ambos os partidos a essa posição e a despeito do fato de 166 homens ainda padecerem lá, agora acredito que Guantánamo deve permanecer aberta - pelo menos por enquanto. 

Embora tenha demorado a me convencer disso, os sinais já eram evidentes há algum tempo. Há três anos, o governo de Barack Obama realizou um amplo exame da situação dos detidos e concluiu que cerca de 40 não podem ser processados, mas são perigosos demais para serem transferidos ou soltos. Eles ainda são mantidos na prisão de acordo com as leis marciais que permitem a detenção sem acusação formal por toda a duração das hostilidades. 

Outros são do Iêmen. Embora muitos atendam às condições para serem transferidos, a transferência foi adiada por tempo indefinido diante da instabilidade no país. Teme-se pela incapacidade do Iêmen em implementar medidas de segurança adequadas e pelo risco de que alguns entrem na Al-Qaeda.
Ainda que os números tenham mudado com o tempo, as categorias permanecem. Eles são homens que o atual governo não pretende transferir, libertar ou processar, enquanto a autoridade legal para detê-los, em razão da lei militar, perdurar. 

Obama alimentou as esperanças dos grupos de defesa dos direitos humanos quando, na campanha para a reeleição, mais uma vez, afirmou que o centro de detenção seria fechado. Não ficou claro, porém, se ele tinha um plano viável e se a estratégia envolveria a transferência de muitos dos detidos para os EUA, onde suas condições de vida, muito provavelmente, piorariam. 

Evolução. A Guantánamo de 2013 não é mais a Guantánamo de 2002. Graças aos grupos de direitos humanos, aos observadores internacionais e aos advogados dos detidos, houve uma melhoria significativa, embora não uniforme, de suas condições. A maioria dos presos agora vive em instalações comunitárias onde podem comer, orar e exercitar-se juntos. 

Se forem transferidos para os EUA, provavelmente, teriam de permanecer em prisões militares em condições semelhantes às das prisões de segurança máxima - confinados a suas celas 22 horas por dia e proibidos de participar de atividades em grupo, inclusive a oração. As melhorias conseguidas a duras penas voltariam ao nível anterior de brutalidade de cinco anos atrás. 

E Guantánamo não seria mais a experiência fracassada numa ilha a muitos quilômetros de distância. O governo Obama estaria criando um novo sistema de detenção sem acusação para os suspeitos de terrorismo em solo americano, estabelecendo um precedente e criando uma instalação disponível para os futuros presidentes que quisessem se livrar de indivíduos potencialmente perigosos. 

A realidade política é que o fechamento de Guantánamo não deverá ocorrer tão cedo e, se vier, suas consequências serão mais negativas do que positivas. Ao contrário, devemos procurar lugares para transferir os que forem inocentados e possam sair da prisão e, o que é mais importante, definir o fim da guerra. 

Num recente discurso, Jeh Johnson, na época consultor jurídico do Departamento da Defesa, discutiu uma futura guinada histórica na qual a Al-Qaeda será tão dizimada que o conflito armado será encerrado. As declarações de funcionários de alto escalão sugerem que esse momento pode estar próximo. E, como os EUA se preparam para deixar o Afeganistão, há mais uma forte premissa para considerar a guerra próxima do fim. Assim, a justificativa legal para as detenções desaparecerá. 

A esta altura, os homens que permanecem em Guantánamo não podem continuar na prisão sem acusação formal, pelo menos sem entrar em conflito com as proibições constitucionais básicas e do direito internacional. Somente então será possível esperar um fechamento definitivo, não recriando uma prisão nos EUA, mas mediante uma trabalhosa transferência, libertação ou processo dos detidos que continuam lá. Enquanto isso, devemos manter Guantánamo aberta.

 / TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA

* É PESQUISADORA DO GEORGETOWN LAW CENTER E FOI CONSELHEIRA DE CONTRATERRORISMO DA HUMAN RIGHT WATCH

Op-Ed Contributor

Don’t Close Guantánamo

WASHINGTON

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IN 2010, I was branded a member of the “Al Qaeda 7” — a notorious label attached to Department of Justice lawyers who were mocked by critics claiming they had “flocked to Guantánamo to take up the cause of the terrorists.” My crime: I advocated for the closure of the detention facility — a position that has also been taken up by the likes of former President George W. Bush, former Secretary of Defense Robert M. Gates and former Secretary of State Colin L. Powell — and for more humane living conditions for those imprisoned there. 

At the time, I reacted defensively. I was indignant. I insisted on the legitimacy of my convictions. But even then the writing was on the wall. For a core group of detainees, closing Guantánamo would not mean release or prosecution, as most human rights and civil liberties groups have long advocated. Rather, it would mean relocation to the United States, or elsewhere, for continued detention. 

Now, almost four years later, I have changed my mind. Despite recognizing the many policy imperatives in favor of closure, despite the bipartisan support for this position, and despite the fact that 166 men still languish there, I now believe that Guantánamo should stay open — at least for the short term. 

While I have been slow to come to this realization, the signs have been evident for some time. Three years ago, Barack Obama’s administration conducted a comprehensive review of the Guantánamo detainees and concluded that about four dozen prisoners couldn’t be prosecuted, but were too dangerous to be transferred or released. They are still being held under rules of war that allow detention without charge for the duration of hostilities. 

Others happened to hail from Yemen. Although many of them were cleared for transfer, the transfers were put on indefinite hold because of instability in Yemen, the fear that some might join Al Qaeda forces, and Yemen’s inability to put adequate security measures in place. 

While the specific numbers have most likely shifted over time, the basic categories persist. These are men whom the current administration will not transfer, release or prosecute, so long as the legal authority to detain, pursuant to the law of war, endures. 

President Obama raised the hopes of the human rights community when during his re-election campaign he once again said the detention center should be closed. But it was not clear whether he had a viable plan, and any such plan would almost certainly involve moving many of the detainees into continued detention in the United States, where their living conditions would almost certainly deteriorate. 

Guantánamo in 2013 is a far cry from Guantánamo in 2002. Thanks to the spotlight placed on the facility by human rights groups, international observers and detainees’ lawyers, there has been a significant, if not uniform, improvement in conditions. 

The majority of Guantánamo detainees now live in communal facilities where they can eat, pray and exercise together. If moved to the United States, these same men would most likely be held in military detention in conditions akin to supermax prisons — confined to their cells 22 hours a day and prohibited from engaging in group activities, including communal prayer. The hard-won improvements in conditions would be ratcheted back half a decade to their previous level of harshness. 

And Guantánamo would no longer be that failed experiment on an island many miles away. The Obama administration would be affirmatively creating a new system of detention without charge for terrorism suspects on American soil, setting a precedent and creating a facility readily available to future presidents wanting to rid themselves of a range of potentially dangerous actors.

The political reality is that closure of Guantánamo is unlikely to happen anytime soon, and if it did, it would do more harm than good. We should instead focus on finding places to transfer those cleared to leave the facility and, more important, on defining the end to the war. 

In a recent speech, Jeh Johnson, then the Department of Defense general counsel, discussed a future “tipping point” at which Al Qaeda would be so decimated that the armed conflict would be deemed over. Statements from high level officials suggest that this point may be near. And as the United States pulls out of Afghanistan, there is an increasingly strong argument that the war against Al Qaeda is coming to a close. With the end of the conflict, the legal justification for the detentions will finally disappear. 

At that point, the remaining men in Guantánamo can no longer be held without charge, at least not without running afoul of basic constitutional and international law prohibitions. Only then is there a realistic hope for meaningful closure, not by recreating a prison in the United States but through the arduous process of transferring, releasing or prosecuting the detainees left there. 

In the meantime, we should keep Guantánamo open. 

Jennifer Daskal is a fellow and adjunct professor at Georgetown Law Center. She has served as counsel to the assistant attorney general for national security at the Department of Justice and as senior counterterrorism counsel at Human Rights Watch.