Nem bem assumiram o
comando de suas cidades, na última terça-feira, prefeitos de municípios
brasileiros já tomaram como uma de suas primeiras decisões nomear
parentes para cargos remunerados de primeiro e segundo escalões. Em
prefeituras do Norte ao Sul do país, mulheres, mães, pais e irmãos de
prefeitos eleitos ou reeleitos no ano passado foram alojados na máquina
municipal.
Segundo maior colégio eleitoral
fluminense, São Gonçalo, na Região Metropolitana, é um dos municípios
onde há casos de nepotismo. O prefeito Neilton Mulim (PR) escolheu seu
irmão, o vereador Nivaldo Mulim (PR), para assumir a Secretaria
Municipal de Desenvolvimento Social. Já na Região Serrana, o prefeito de
Petrópolis, Rubens Bomtempo (PSB), que está em seu terceiro mandato,
nomeou a mulher, Luciane Bessa Bomtempo, para o cargo de
secretária-chefe de gabinete, e o cunhado, Eduardo Ascoli de Oliva Maia,
para comandar a Secretaria de Planejamento e Urbanismo.
Em Alagoas, nem uma lei editada
em 2008, que proíbe o nepotismo, impede que os prefeitos empreguem
parentes. Em São Luís do Quitunde, o ex-prefeito Ciço das Cachorras
(PMDB), ex-motorista do senador Renan Calheiros (PMDB), ajudou a eleger o
vice, Eraldo Pedro. No acordo político, Ciço foi parar na Secretaria de
Finanças. A mulher, Doda Cavalcante (PMDB), faturou uma vaga na
Educação. Ciço das Cachorras, que cuida das finanças, já foi preso por
desviar verba da merenda escolar e indiciado por compra de votos.
- É um velho costume de usar a
máquina pública para fins particulares. É um atentado contra qualquer
vida pública decente e não há nenhuma justificativa – afirmou o
professor de Filosofia Política da Unicamp Roberto Romano, que recorda
os critérios da moralidade e da competência previstos na Constituição
para o preenchimento de cargos públicos.
Em capitais, a prática também
não cessou. O prefeito de Teresina, Firmino Filho (PSDB), rompeu uma
tradição de seis mandatos de não nomear parentes. Ele nomeou sua mulher,
Lucy Soares, para a Coordenadoria de Defesa da Mulher.
- Nomeei porque ela tinha disposição e vontade de exercer o cargo em defesa das mulheres – declarou Firmino Filho.
Casal na prefeitura de Teresina: Firmino Filho e a mulher, nomeada como coordenadora
O prefeito de Curitiba, Gustavo
Fruet (PDT), indicou a esposa, Márcia Fruet, para comandar a Fundação de
Ação Social (FAS) e a irmã, Eleonora Fruet, para assumir a Secretaria
de Finanças. O salário mensal dos secretários municipais na capital
paranaense é de R$ 13,5 mil. Fruet sustenta que os parentes são
profissionais de sua confiança. Na prefeitura de Manaus, o ex-senador
Arthur Virgílio (PSDB) nomeou a mulher, Goreth Garcia, para a Secretaria
de Assistência Social, mas afirmou que a esposa não receberá o salário
do cargo, de R$ 18 mil.
Em Manga (MG), o prefeito
Anastácio Guedes (PT) emplacou três parentes no primeiro escalão. O
cunhado assumiu a Secretaria de Agricultura Familiar; a cunhada, a
Secretaria de Assistência Social; e o sobrinho, a Secretaria de
Administração. Em Carnaubais (RN), o prefeito reeleito, Luizinho
Cavalcante (PSB), indicou o irmão, Nicolau Cavalcante, para a Secretaria
da Educação e a esposa, Mária Cavalcante, para a Secretaria da
Assistência Social.
- Não há nenhuma lei que proíba a
indicação de parentes para cargos de secretário municipal, de primeiro
escalão. Não há problema nenhum, pelo menos é o que informou a minha
assessoria jurídica – afirmou o prefeito Anastácio Guedes.
Súmula do STF provoca diferentes interpretações
Em 2008, o Supremo Tribunal
Federal (STF) aprovou a Súmula Vinculante nº 13, que vedou o nepotismo
nos Três Poderes, nos âmbitos federal, estadual e municipal. A medida
proibiu a contratação de parentes de autoridades e de funcionários para
cargos de confiança, de comissão e de função gratificada no serviço
público.
Em decisões judiciais
posteriores, a Suprema Corte flexibilizou a iniciativa para cargos
considerados de “natureza política”, entre eles de secretários
municipais. A incerteza sobre o alcance da medida tem gerado discussões
nos meios jurídicos. Na avaliação de juristas e especialistas, o
entendimento de que a restrição não se aplica aos cargos políticos não
está consolidado.
- Se essa jurisprudência
estivesse consolidada, o Supremo Tribunal Federal teria feito uma
espécie de retificação pontual da Súmula Vinculante Nº 13, o que ainda
não foi feito – avaliou o procurador Gustavo Binenbojm, professor de
Direito da UERJ.
Para o professor Gustavo
Alexandre Magalhães, doutor em Direito Administrativo pela UFMG, o texto
da súmula deixou brechas, o que possibilita aos prefeitos interpretarem
de acordo com suas conveniências.
- Alguns pontos precisam ser
esclarecidos. Pelo texto atual, o prefeito pode preencher seu primeiro
escalão só com parentes, caso assim queira – afirmou.