segunda-feira, 20 de abril de 2009

Síntese de minha palestra no Fórum Brasil de Educação (2003). Por ela, pode-se ver que sei bem o que significa autonomia universitária.

Peço aos leitores que leiam com atenção o último §, referente às minhas recomendações ao Fórum. Alí, fica bem clara a minha atitude contra os dirigismos que entravam a pesquisa e o ensino universitários. E antes, muito antes disto, eu defendia a mesma atitude contra o dirigismo. A matéria não é recente, nem foi descoberta agora, ao contrário do que tentam fazer pessoas que, apenas por estarem em postos de poder, julgam-se iluminadas por forças sobrenaturais.
RR


CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO

FÓRUM BRASIL DE EDUCAÇÃO

RELATÓRIO
2003

Brasília
Março/2004

Roberto Romano da Silva – Professor Titular do Departamento de Filosofia do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP

No início da tarde, o professor Roberto Romano apresentou o sub-tema: Urgências da Universidade Brasileira, compreendendo-o como desdobramento do tema “A universidade e as demandas da sociedade”. O moderador foi o Conselheiro da Câmara de Educação Superior do CNE, Roberto Cláudio Frota Bezerra e o relator, o Conselheiro Ataíde Alves, também da Câmara de Educação Básica.

O professor Roberto Romano iniciou sua exposição formulando um diagnóstico da atual crise conjuntural brasileira, bastante complexa, implicando elementos da corrupção institucionalizada, a busca inconseqüente pelo lucro, a barbárie das superpotências e o crime organizado do narcotráfico. O contexto da crise foi ainda ampliado na descrição do expositor, incluindo a insensibilidade social das elites brasileiras e a perda da identidade, caso permaneçamos sem parâmetros próprios para o pensamento nacional.

O expositor prosseguiu definindo a linha de argumentação que adotaria para desenvolver o tema Urgências da Universidade Brasileira. Afirmou que retomaria algumas teses enunciadas pelo etnólogo André Leroi-Gourhan destinadas ao estudo da origem e desenvolvimento das técnicas e dos saberes humanos, desde a pré-história até o século 20. Segundo Gourhan, citado pelo palestrante, o elemento tecnológico é decisivo, em última instância, de toda a vida social de uma civilização.O etnólogo mostra, afirmou o professor Romano, como a tecnologia consiste de um sistema onde, “dado um traço, todos os demais se definem, com maior ou menor densidade ou
coerência”. Lembrou, ainda, que o progresso tecnológico e científico foram conquistas lentas da humanidade ao longo de milênios, da postura ereta à formalização da linguagem".

Para expor a sua perspectiva sobre o assunto, o Prof. Romano percorreu algumas teorias sobre a techne, desde Heidegger - que assinala a técnica como uma presença metafísica que aprisionou o ser humano, exilando-o do Ser -, até uma extensa revisão bibliográfica acerca dos estudos destinados às mãos, que vai de Platão, Aristóteles, até Hegel (e gênese da noção de conceito como garra/permanência) e Canetti. Concluindo a argumentação, sustentada nas hipóteses de Leroi-Gourhan, o professor Roberto Romano assinalou a importância das mãos e do seu funcionamento para o desenvolvimento cognitivo humano como fundamento da técnica. Contudo, há um embate fundamental de forças na troca humana por técnicas. Todo grupo humano, explica o expositor ainda citando Leroi-Gourhan, é animado por duas forças contrárias e conjugadas: uma tende a afirmar o próprio grupo, suas características e modos de lidar O etnólogo mostra, afirmou o professor Romano, como a tecnologia consiste de um sistema onde, “dado um traço, todos os demais se definem, com maior ou menor densidade ou coerência”.

Lembrou, ainda, que o progresso tecnológico e científico foram conquistas lentas da humanidade ao longo de milênios, da postura ereta à formalização da linguagem. Para expor a sua perspectiva sobre o assunto, o Prof. Romano percorreu algumas teorias sobre a techne, desde Heidegger - que assinala a técnica como uma presença metafísica que aprisionou o ser humano, exilando-o do Ser -, até uma extensa revisão bibliográfica acerca dos estudos destinados às mãos, que vai de Platão, Aristóteles, até Hegel (e gênese da noção de conceito como garra/permanência) e Canetti.

Concluindo a argumentação, sustentada nas hipóteses de Leroi-Gourhan, o professor Roberto Romano assinalou a importância das mãos e do seu funcionamento para o desenvolvimento cognitivo humano como fundamento da técnica. Contudo, há um embate fundamental de forças na troca humana por técnicas. Todo grupo humano, explica o expositor ainda citando Leroi-Gourhan, é animado por duas forças contrárias e conjugadas: uma tende a afirmar o próprio grupo, suas características e modos de lidar O etnólogo mostra, afirmou o professor Romano, como a tecnologia consiste de um sistema onde, “dado um traço, todos os demais se definem, com maior ou menor densidade ou coerência”. Lembrou, ainda, que o progresso tecnológico e científico foram conquistas lentas da humanidade ao longo de milênios, da postura ereta à formalização da linguagem.

Nesse ponto, o professor Roberto Romano desenvolveu a tese de que o progresso técnico de uma civilização se faz através da combinação da capacidade de “emprestar” objetos técnicos e “inventar” novos objetos técnicos. Ilusão é afirmar, observou, que um grupo humano possa viver e avançar tecnologicamente apenas de empréstimos ou de pura invenção da técnica. Nem todos os grupos possuem todos os instrumentos e saberes iguais ao mesmo tempo. Ressalta, ainda, que “privilegiar apenas a invenção, em detrimento do empréstimo seria suprimir a história e a contingência do que advém”. Por outro lado, continuou, ficar apenas com o empréstimosignificaria “afetar o grupo com uma passividade total”. Daí surge o conceito de fixação tecnológica, em oposição ao de flutuação tecnológica, ou seja, quando um grupo humano é capaz de incorporar em sua cultura uma tendência de inovação a partir de um empréstimo. Assim, concluiu, é o par de opostos fixação/flutuação que caracteriza o sucesso do desenvolvimento na área tecnológica, e não o par empréstimo/inovação. Após a introdução acima, o professor Roberto Romano iniciou a análise do problema do desenvolvimento tecnológico no Brasil. Observou que no período colonial foram vetadas as implantações de fábricas e universidades no país. Segundo ele - “Vivíamos em outros e para os outros, em termos técnicos”. Pontuando que nossos estudantes, na época, formavam-se na Europa e a situação só se reverteu com a chegada da Família Real Portuguesa que aportou no Brasil trazendo consigo missões científicas e artísticas. Com isso, bibliotecas (inclusive a biblioteca do Rei, hoje Biblioteca Nacional) e laboratórios começaram a se formar.

Outro importante e curioso momento da nossa história universitária, destacou o professor Romano, refere-se às intervenções dos positivistas, que a princípio ficaram contra a universidade, pois não a consideravam lugar para o ensino das ciências, e sim como lugar de ensino e cultivo intelectual da metafísica e teologia. A Universidade de São Paulo, inclusive, sob a influência do pensamento positivo, lembrou o palestrante, chegou a ser pensada como produtora de elites acima do povo “impuro”. Contudo, setores da universidade e dos governos brasileiros conseguiram implantar a dialética do empréstimo e da invenção tecnológicas buscando fixar tendências. Notadamente, lembra o palestrante, nos governos de Vargas e JK, houve iniciativas para incentivar as ciências e as técnicas no Brasil e o contrário ocorreu no governo Dutra.O professor Roberto Romano destacou ainda a importância da indústria e do comércio na fixação de tendências em tecnologia no País, através do SESI, do SESC e do SENAC.


O professor continuou lembrando que os setores ricos do povo brasileiro jamais dependeram, a rigor, das universidades oficiais, públicas e ressaltou, segundo o seu percurso conceitual, no Brasil não emprestamos nem inventamos o bastante para fixar tendências que nos permitam superar a nossa grave crise estrutural. Recentemente, inclusive, lembra o palestrante, o pouco que emprestamos, o pouco que inventamos, foi atacado no seu prisma mais estratégico, a fixação de tendência. Esta perda não recupera o aumento do índice BOVESPA. Anos de pós-graduação podem seguir para o nada, alertou. O expositor seguiu sua argumentação constatando que pela primeira vez, após três décadas de crescimento contínuo, caiu a participação do Brasil na produção científica mundial, passando de 1,08%, em 2000 para 0,95% no ano passado. Uma queda de 12%. Segundo o professor Romano, um dos diagnósticos mais acertados foi realizado pelo Reitor da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), quando afirma que “O Brasil ainda não conseguiu fazer uma conexão entre ciência, tecnologia e riqueza”.

Contudo, observou o palestrante, vivemos uma integração inédita no país entre os setores acadêmico e empresarial, o que nos aproxima do equilíbrio entre inovação tecnológica e produção industrial. Como exemplo, o expositor citou recente constatação no Jornal da Ciência, que revela o crescimento da produção científica no Brasil, com cerca de 11% de 2000 para 2001, passando de 9511 para 10555 artigos publicados.

Contudo, observou o palestrante, vivemos uma integração inédita no país entre os setores acadêmico e empresarial, o que nos aproxima do equilíbrio entre inovação tecnológica e produção industrial. Como exemplo, o expositor citou recente constatação no Jornal da Ciência, que revela o crescimento da produção científica no Brasil, com cerca de 11% de 2000 para 2001, passando de 9511 para 10555 artigos publicados.

As recomendações do professor Romano recaíram em dois pontos: primeiro, sugeriu que o monopólio das políticas de Ciência e Tecnologia não pode ser exercido pelo Governo e, em particular, pelo Executivo. Segundo suas palavras – “O CNPq e a Capes e o próprio Ministério de Ciência e Tecnologia não podem mais depender das decisões de uma equipe que domina a técnica dos cortes orçamentários, sendo alheia ao investimento estratégico na área científica em todas as suas especialidades”. E, segundo, a universidade deve produzir instrumentos de conexão entre o saber acadêmico e a indústria. – “É tempo, enfim, para a universidade, de assumir seu nome, continuando a ser ao mesmo tempo universal e particular, servindo como instrumento eficaz de aquisição e invenção de saberes, transmitindo-os em larga escala ao povo. Isso supõe, inclusive e, sobretudo, produzir instrumentos de conexão entre o saber acadêmico e a indústria”.