sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

O Globo

Ética longe do palanque

Depois do escândalo no governo Arruda, discussões sobre corrupção e apagão devem passar longe dos ataques eleitorais em 2010

Publicada em 03/12/2009 às 23h59m

Carolina Benevides

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RIO - Acostumados a subir nos palanques para exaltar suas qualidades e bater nos pontos fracos dos adversários, os candidatos à Presidência da República e a governador terão que pensar em outra estratégia para as eleições de 2010, depois das denúncias de mensalão tanto no PT como no PSDB de Minas e no DEM do Distrito Federal . "O roto não pode falar do esfarrapado", diz Roberto Romano, professor de Ética e Política da Unicamp:

" Como PT, DEM e PSDB têm seu mensalão, acredito que as campanhas serão baseadas nas grandes obras já realizadas "

- Como PT, DEM e PSDB têm seu mensalão, acredito que as campanhas serão baseadas nas grandes obras já realizadas. Dilma (a ministra Dilma Rousseff, do PT) não deve abrir mão do PAC, e o Serra (o governador tucano de São Paulo) vai aproveitar para relembrar o que fez quando era ministro da Saúde e as mudanças no governo de São Paulo.

Para Roberto Romano, para evitar assuntos como o mensalão e o recente apagão que atingiu 18 estados e o que aconteceu durante o governo Fernando Henrique Cardoso, em 2001, os candidatos podem apelar para o futuro.

- Projeções sobre o avanço do país ajudam a mudar o foco. E, ao usar esse argumento, quem tiver mais capacidade de retórica sai na frente. Agora, se essa expectativa de o discurso da ética não aparecer nos palanques se cumprir, esse será um momento inédito no Brasil.

"Não atacar pode ser consenso entre os partidos"

" Acredito que as campanhas serão feitas em cima de assuntos que não caminhem para a questão ética "

Coordenador de cursos de pós-graduação em Ciência Política da Universidade Federal Fluminense (UFF), Eurico Figueiredo concorda que os candidatos com chance real de chegar ao Planalto vão fazer o possível para não tocar em questões, no mínimo, polêmicas.

- As lideranças partidárias podem costurar um acordo de cavalheiros e fazer com que não atacar seja consenso. Acredito que as campanhas serão feitas em cima de assuntos que não caminhem para a questão ética. Mesmo o apagão, se aparecer, não deve ocupar muito espaço. Como a memória popular é curta, isso permite que tanto PT quanto PSDB divulguem os episódios como algo brando.

Segundo ele, os candidatos ditos "menores", incluindo Marina Silva, pré-candidata à Presidência pelo PV, e Ciro Gomes, se confirmar sua candidatura pelo PSB, talvez sejam os únicos a mencionar o mensalão dos três partidos.

- Ela pode usar o discurso da ética argumentando que sempre foi correta, que não estava no Congresso quando o mensalão do PT veio à tona e que deixou o partido - diz Eurico, afirmando que Marina conseguiria debater até com quem disser que a ex-ministra só se desfiliou do PT quatro anos depois do escândalo. - Basta lembrar que a desfiliação aconteceu quando entendeu que não havia mais condições políticas e que em toda sua vida pública nunca encontraram nada contra ela.

Segundo Eurico, os estragos podem ser grandes para os candidatos à Presidência do PT e do PSDB se Ciro e Marina realmente resolverem bater no mensalão.

- As pessoas começariam a se perguntar: por que os candidatos do PT, do PSDB e do DEM não tocam nesses assuntos? Por que não falam sobre esse capítulo de seus partidos? Isso pode gerar uma reação nada favorável para Dilma e Serra.

Debates podem deixar políticos numa saia justa

Mesmo proibidos no palanque, os episódios do mensalão e do apagão podem deixar os políticos numa saia justa. Segundo David Flescher, professor de Ciência Política na Universidade de Brasília (UnB), os candidatos não conseguirão evitar o assunto durante os debates.

- Vão blindar palanques e até os programas de TV. Ricardo Berzoini, presidente nacional do PT, já deu esse aviso ao dizer que o partido "não é oportunista nem vai baixar o nível". Mas mesmo que o PSDB só queira bater na qualidade de gestão do governo Lula e que o PT só pretenda bater no governo FH, nos debates a imprensa e a população fazem as perguntas que acham pertinentes, e elas precisam de respostas.