Liberar candidato "conta suja" é retorno ao estado de anarquia, diz Roberto Romano
Aiuri Rebello e Felipe AmorimDo UOL, em São Paulo
Analistas políticos ouvidos pelo UOL são unânimes em lamentar a decisão do TSE
(Tribunal Superior Eleitoral) que revoga a resolução da própria corte
de impedir o registro de candidatos que tenham tido contas de eleições
passadas reprovadas. "Para mim, é um retorno ao estado de anarquia e
perda de controle da sociedade sobre os homens políticos", afirmou
Roberto Romano, professor de Ética e Política na Unicamp (Universidade
Estadual de Campinas).
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Romano afirma não estar surpreso com a resistência dos partidos
políticos à decisão do TSE. "Nossos partidos são tudo, menos partidos.
São agremiações que cuidam de interesses grupais. Então, para eles, a
eleição não é um ato cívico, a eleição é um negócio", diz Romano.
Para o professor, o espírito republicano e democrático da Constituição
de 1988 ainda não foi absorvido pela classe política no país. "A
mentalidade dos nossos políticos é absolutista, de que uma vez que virou
excelência não tem que prestar contas a ninguém", afirma Romano.
As exigências de transparência e prestação de contas feitas por
inovações legislativas como a Lei da Ficha Limpa e a Lei de
Responsabilidade Fiscal – as quais Romano chama de “leis de salvação
nacional” -- são mecanismos que ajudam a modificar a atitude e a
mentalidade dos partidos políticos, segundo defende o professor.
"A prestação de contas não é uma formalidade, é algo que define a concepção democrática de Estado", afirma Romano.
“Regras claras”
O advogado Torquato Jardim, ex-ministro do TSE, defende que seja
exigida a aprovação das contas para a emissão da certidão de quitação
eleitoral. "Quem teve conta rejeitada está se candidatando a um cargo
público relevante, logo isso é um retrocesso", afirma Torquato. Segundo o
advogado, as regras de prestação de contas são de fácil entendimento e
bem conhecidas. "O candidato sabe como pode gastar e de quem pode e não
pode receber. As regras do jogo são claras. Como pode [o candidato] não
saber nem prestar contas?", indaga o advogado.
VEJA O PLACAR DA VOTAÇÃO
MINISTROS | A FAVOR | CONTRA | ||||||||||||||||||||||
Nancy Andrighi | X | |||||||||||||||||||||||
Cármen Lúcia | X | |||||||||||||||||||||||
Marco Aurélio | X | |||||||||||||||||||||||
José Antonio Dias Toffoli | X | |||||||||||||||||||||||
Henrique Neves | X | |||||||||||||||||||||||
Gilson Dipp | X | |||||||||||||||||||||||
Arnaldo Versiani | X |
A primeira decisão do TSE, de limitar o registro de candidatura àqueles
que tiveram as contas eleitorais aprovadas, foi tomada com base na
interpretação de princípios constitucionais, afirma Torquato.
Segundo ele, a Constituição, no seu artigo 14, afirma que deverá ser
levada em conta a vida pregressa do candidato para "proteger a probidade
administrativa". No artigo 37, afirma como princípios da administração
pública a "legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e
eficiência". Além disso, acrescenta Torquato, o princípio da
transparência nas contas públicas está bem sedimentado na interpretação
da Constituição feita por diversos tribunais.
“Isso é um retrocesso e traz prejuízo para a prestação da Justiça
Eleitoral porque vai liberar a candidatura de pessoas que não têm o
menor predicado para se lançarem [candidatos]”, afirma o juiz Marlon
Reis, juiz eleitoral da cidade de João Lisboa (MA) e membro do MCCE
(Comitê Nacional do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral).