domingo, 22 de março de 2009

Notícia velha, o PSOL e o delegado.

Quando o "desarmamento"era discutido no país, fui contra a proibição de armas para a cidadania. Certo promotor arrogante, na Globo News, me "ensinou"o beabá do Estado moderno, o famoso "monopólio legítimo da força física". Insisti ao longo dos meses sobre o perigo, para os demacratas claro, porque para os demais o Estado é deus, de atingir a radicalidade naquele monopólio. Cidadão desarmado não pode resistir às tiranias, do Estado ou dos bandidos. Recordei os princípios das revoluções modernas, que instauraram as democracias ocidentais: o sagrado direito da milícia, um dos itens mais debatidos nos EUA, democracia que merece o nome, apesar de todos os seus defeitos. Recordei Diderot, entusiasta da Revolucão norte americana, que escreveu na Apóstrofe aos Insurgentes da América: "quando vocês forem conversar com os governantes, levem sempre o fusil nas costas, para que eles percebam de onde vem o poder que exercitam".

Em todos os debates a que compareci, escutei argumentos sofísticos que desviavam a questão democrática. Os tutores do povo (advogados, juízes, promotores, padres, etc) tocavam uma questão técnica, "esquecendo"os princípios. "O cidadão não tem o mesmo treino dos bandidos". Questão técnica. Treino pode ser conseguido. Mas todos ficavam quietos sobre a questão essencial: o Estado tem direito absoluto no uso da força física? Se respondessem "sim", precisariam enfrentar o que ocorreu no totalitarismo, quando manadas de seres humanos foram tangidas para a guerra ou para os campos de concentração. Eles teriam de negar todo direito de resistência e ficariam sem resposta para os genocídios como os do Camboja, da África, etc.

Uma segunda questão que eles não respondiam, ou que eludiam com palavras que servem para mascarar o problema: se o Estado tem direito absoluto sobre a força e se o mesmo Estado não a usa para garantir a segurança dos cidadãos, o que fazer? Vimos o espetáculo de pessoas honestas, cuja família fora sequestrada no próprio lar, sofrido abusos vários, e que, usando uma arma, renderam os criminosos. A polícia (como diz Tracy Chapman, ela sempre chega tarde, se chega...)prendeu os que resistiram. Um Estado covarde e ineficiente, prende quem está por perto e é honesto. Mas treme nas bases quando se trata de enfrentar a república do narcotráfico, que usurpa inclusive a soberania, decretando quem e quando é permitido andar no espaço dominado pelos chefões.

Certo dia um colega me telefonou pedindo que eu participasse de um "debate"sobre a proibição de armas. Agradeci e confirmei minha presença, avisando que defenderia o armamento dos cidadãos honestos. Recebi gritos, slogans e...desconvite. Um debate assim é próprio do Brasil escravo: só debatem os que estão a favor...

Vejam a notícia abaixo. Um pesquisador que, na sua faina precisa de armas e trará benefícios coletivos, é ameaçado pela Polícia. Esta última mostra plena ineficácia no combate aos arsenais de narcotraficantes e de outros ramos delinquentes. Prender um cientista é fácil, o que marca a tibieza dos que operam o monopólio da força física entre nós. É por motivos semelhantes que a "luta contra a corrupção"sempre é barrada nos tribunais decentes : os repressores, por truculência contra os mais fracos, "esquecem" a lei e as garantias individuais. E depois recebem solidariedade de partidos que se imaginam angélicos, mas que se revelam filhotes do pior autoritarismo. Desde que o PSOL se uniu à polícia, na pessoa do Sr. Protógenes, que nenhum representante da agremiação me procure. Pois escutará poucas e boas.

Roberto Romano


São Paulo, domingo, 22 de março de 2009



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Lei falha converte biólogo que porta arma em bandido

Mesmo com licença do Ibama, pesquisadores que coletam espécimes têm tido armas apreendidas pela Polícia Federal

Estatuto de 2004 não prevê figura do coletor entre os profissionais autorizados a usar arma; grupo articula manifesto para autoridades

Rafael Garcia - 01.nov.08/Folha Imagem

Alexandre Aleixo, ornitólogo do Museu Goeldi, dentro da mata no Pará com sua espingarda

RAFAEL GARCIA
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma omissão na legislação que trata do porte de armas de fogo tem levado biólogos a inesperadas passagens pela polícia. Impossibilitados de portar espingardas desde 2004 -data de criação do Estatuto do Desarmamento-, pesquisadores devidamente autorizados pelo Ibama para coletar animais têm tido armas apreendidas e licenças de trabalho negadas pela Polícia Federal.
Um abaixo-assinado que circula desde o ano passado entre diversas classes de biólogos deve ser encaminhado em breve a autoridades federais. O manifesto, assinado por pesquisadores das principais universidades e museus brasileiros, pede a criação de uma nova categoria legal, a de coletor/pesquisador, na lista dos profissionais autorizados a transportar armas.
Segundo o documento, a impossibilidade de coletar animais por tiro não afeta só a biologia básica. A criação de reservas e o controle de zoonoses também são dificultados.
"A gente tem o exercício pleno da profissão tolhido por causa de um preconceito contra a arma, que é uma ferramenta de trabalho", afirma o ornitólogo Rômulo Ribon, da Universidade Federal de Viçosa, um dos articuladores do abaixo-assinado. "Você consegue ou não a licença dependendo da boa vontade do delegado."

Apreensão e inquérito
B.T.T., biólogo ouvido pela Folha, não teve essa sorte com o policial que fiscalizou seu equipamento na volta de uma missão de campo na Amazônia. Mesmo apresentando documentação conforme a PF recomenda, ele foi barrado antes de um voo doméstico.
"O delegado apreendeu minha arma e ameaça me processar. Tive de pagar um advogado", conta. "Ele está fechando inquérito agora e vai encaminhar ao Ministério Público, sugerindo que a arma seja devolvida. Vai depender de eles [promotores] aceitarem ou não."
O delegado que inspecionou o biólogo aparentemente contrariou a recomendação do Sinarm (Serviço Nacional de Armas), administrado pela PF.
"A atividade do coletor de espécimes pode ser desenvolvida de forma lícita se ele tiver um certificado de registro de caçador junto ao Comando do Exército, e também -para não configurar um crime ambiental- uma autorização do Ibama para fazer o abate", afirma Douglas Saldanha, delegado-chefe-substituto do Sinarm. "Ele precisa também transportar a arma desmuniciada, num estojo adequado, desmontada, e não pode usá-la num meio urbano."
B.T.T, porém, disse que havia seguido as regras à risca.
Outro biólogo entrevistado pela Folha, S.N.M., teve uma burocracia a mais antes de ir para uma missão de campo.
"O trabalho envolvia um transporte interestadual, e eu dependia de uma ata da PF para levar a arma", conta. "Fui lá, expliquei toda a situação. O delegado fez mil perguntas."
Após um gesto de compreensão e de uma despedida cordial, o biólogo teve o pedido apreciado pelo delegado alguns dias depois: "Foi indeferido".
O episódio, diz, aconteceu em 2002, quando a legislação de armas era mais permissiva. Diante da necessidade de dados para seu doutorado, porém, o pesquisador não teve dúvidas. "Não obtive a licença para transportar a arma, mas acabei levando mesmo assim."

Filme queimado
Ribon reconhece que biólogos agem "na clandestinidade" ocasionalmente. "Mas a gente pede para eles não fazerem assim, porque isso vai "queimar o filme" da classe", diz.
Saldanha, da Polícia Federal, apela para o fato de que "é possível exercer a atividade licitamente" -e de que biólogos não têm foro privilegiado. Mas reconhece que a lei não ajuda. "Para que não houvesse nenhuma insegurança jurídica, o ideal seria que a legislação fosse um pouco mais específica", diz.
Até agora, porém, os biólogos não conseguiram cativar o Poder Legislativo. "Contatei oito deputados federais e só um se dispôs a ajudar", diz Ribon.