Membros de Comissão da Verdade pregam investigação sem revanchismo
Dipp afirma que objetivo do trabalho é promover a ‘reconciliação nacional’ e resgatar a memória
11 de maio de 2012 | 22h 30
Ricardo Brito e Tânia Monteiro, de O Estado de S. Paulo
BRASÍLIA - Escolhido pela presidente Dilma Rousseff para
compor a Comissão da Verdade, o ministro do Superior Tribunal de
Justiça (STJ) Gilson Dipp afirmou nesta sexta-feira, 11, que o trabalho
do colegiado poderá contribuir para a “reconciliação nacional” sem
nenhum “revanchismo” e que atuará “doa a quem doer”.
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O magistrado acredita que não haverá resistência às investigações do
grupo, que começa os trabalhos oficialmente na próxima quarta-feira.
“Não (haverá resistências). Acho que a sociedade como um todo vai
absorver o sentido da lei (que criou a Comissão da Verdade, de novembro
do ano passado), que é resgatar a memória nacional, trazendo à tona
violações graves dos direitos humanos, reconstruindo a história e
fazendo a pacificação nacional”, disse Dipp, no intervalo do encontro da
comissão de juristas do Senado que discute mudanças no Código Penal.
Para o ministro do STJ, a intenção da lei não é revanchismo a
qualquer pessoa ou grupo: “É a procura de uma reconciliação nacional,
doa a quem doer”.
O magistrado, que foi elogiado pelos colegas da comissão de juristas
durante a sessão, contou que recebeu a primeira sondagem para compor a
Comissão da Verdade há 48 horas e o convite de Dilma na quinta-feira à
tarde. “Eu fui pego de surpresa”, afirmou Dipp, que não quis adiantar
nenhuma linha de atuação do colegiado antes de se encontrar com os
outros seis integrantes.
Para Dipp, a comissão é uma questão do “Estado brasileiro” e “não de
governo”. O ministro do STJ disse que desde o governo Fernando Henrique
Cardoso, passando pela gestão Lula, e agora com Dilma Rousseff, o tema
vem sendo debatido.
Ele ressaltou que comissões desse tipo têm sido abertas em várias nações que passaram por violações de direitos humanos. “Então o Brasil está caminhando na mão certa”, disse.
O magistrado acrescentou que não é um problema o Brasil ter demorado a
criar sua Comissão da Verdade. “Temos que trabalhar com a nossa
realidade, com aquilo que vamos deliberar. A questão é nossa, a
responsabilidade é nossa.” Dipp disse que “certamente” o propósito da
comissão será cumprido.
Prazos. Pela lei que a criou, o grupo terá dois anos
para apurar violações aos direitos humanos entre 1946 e 1988, período
que abrange a ditadura militar. Ao fim dos trabalhos será produzido um
relatório com as conclusões dos crimes investigados. Mas a Lei de
Anistia, de 1979 e mantida em vigor por decisão do Supremo Tribunal
Federal, não permite a punição de pessoas envolvidas com os crimes.
Questionado se o País poderia ir além, punindo agentes do Estado ou
militares, ele respondeu: “Não vou fazer este comentário porque não
estou autorizado a fazer, por enquanto”.
Sem revanche. Também integrante da comissão, o
ex-procurador-geral da República Claudio Fonteles disse que o papel será
“buscar a reconstituição da história sem nenhum tipo de revanchismo” ou
perseguição. “Não há espaço para isso”, ressaltou ele, assegurando que
“ninguém vai perseguir ninguém”, até porque existe a Lei de Anistia, que
vale para todos os lados. “Temos de virar esta página da história do
Brasil. Precisamos criar uma memória e estabelecer a verdade, mas
ninguém vai reescrever a história”, avisou ele.
Segundo Fonteles, que foi procurador no primeiro mandato do
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, “existe uma lei que reconhece
que o Estado brasileiro violou os direitos humanos”. “É aí que vamos
reconstituir a história, aproveitando já o trabalho da comissão de
mortos e desaparecidos políticos do Ministério da Justiça.” Para ele,
“nenhum Estado pode violar os direitos humanos e o que se pretende com a
comissão é evitar que estes fatos se repitam”.
De acordo com Fonteles, não há o que temer os militares. “Ninguém vai
perseguir ninguém. Existe uma lei de anistia em vigor”, declarou.
Questionado sobre a revisão da Lei de Anistia, foi taxativo:
“Impossível”.