País rompe com a cultura do sigilo
24 de Maio, às 00:00, em Midia
Uma lei que exige transparência do poder público, autoridades dispostas a
enfrentar a cultura do sigilo divulgando salários do funcionalismo e uma
comissão que vai trazer à tona episódios de tortura e morte durante a ditadura.
Vinte e sete anos após a redemocratização, o Brasil vive momento inédito de
debate sobre seus problemas atuais e do passado.
Transparência é a palavra da moda no Brasil.
Em um país que viveu quase 500 anos de regime arbitrário, com a democracia avançando há pouco mais de duas décadas, as recentes decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) e da presidente Dilma Rousseff despertaram um debate sem precedentes. Em nome da transparência, criou-se a Comissão da Verdade, aprovou-se a Lei de Acesso à Informação e decidiu-se divulgar os salários no serviço público.
Ontem, só no Rio Grande do Sul, Assembleia Legislativa, Ministério Público e Tribunal de Contas anunciaram que vão revelar a remuneração dos seus servidores – sejam eles graúdos ou modestos. São decisões que vieram na esteira da medida do STF, que, na terça-feira, decidira divulgar seus salários. Emparedados, o Senado e a Câmara deliberaram fazer o mesmo.
– Estamos caminhando para uma transparência democrática que, no meu entender, é inédita no país – avalia Roberto Romano, professor de Ética Política da Unicamp.
Mas Romano lembra que, em contraponto a tudo isso, já surgiu na Câmara um movimento contrário: a imprensa descortinou um grupo de diretores procurando brechas legais para sonegar informações – especialmente na divulgação de notas fiscais. A tentativa de manobra apenas ilustra uma cultura que, modelada durante séculos de arbitrariedades, reluta em aceitar a palavra da moda.
– Ainda estamos todos acostumados ao sigilo e ao uso corrupto do sigilo, bem ao estilo do absolutismo – afirma Romano.
Não quer dizer que você, leitor, seja um totalitário em potencial. Significa apenas que o Brasil convive com um regime democrático desde o final dos anos 80 – nações como os Estados Unidos, por exemplo, usufruem da democracia há mais de 200 anos. O resultado é que, no Brasil, o governo federal ainda centraliza 70% do bolo tributário, os Estados pouco decidem sobre os próprios investimentos e os partidos são dominados por dois ou três caciques.
Controle nos gastos
– Somos uma democracia recente que terá novos avanços. Mas estamos presenciando a criação de mecanismos administrativos importantes. É possível vislumbrar um controle maior dos gastos públicos – analisa Ingrid Sarti, professora de Ciência Política e Relações Internacionais da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Quando um professor entra em greve pedindo aumento salarial, segundo Ingrid, a população tem o direito de saber quanto ele ganha de fato. Hoje, não é possível buscar esse dado com precisão, já que os contracheques incluem bonificações, triênios, funções gratificadas. Essas informações serão claras a partir de agora. Diz o historiador Marco Antonio Villa, da Universidade Federal de São Carlos:
– Isso tudo é uma vitória da cidadania. Mas a maior transparência é outra: é a que consegue, se não eliminar, domar a corrupção. Ainda não é o que estamos vendo.
Transparência é a palavra da moda no Brasil.
Em um país que viveu quase 500 anos de regime arbitrário, com a democracia avançando há pouco mais de duas décadas, as recentes decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) e da presidente Dilma Rousseff despertaram um debate sem precedentes. Em nome da transparência, criou-se a Comissão da Verdade, aprovou-se a Lei de Acesso à Informação e decidiu-se divulgar os salários no serviço público.
Ontem, só no Rio Grande do Sul, Assembleia Legislativa, Ministério Público e Tribunal de Contas anunciaram que vão revelar a remuneração dos seus servidores – sejam eles graúdos ou modestos. São decisões que vieram na esteira da medida do STF, que, na terça-feira, decidira divulgar seus salários. Emparedados, o Senado e a Câmara deliberaram fazer o mesmo.
– Estamos caminhando para uma transparência democrática que, no meu entender, é inédita no país – avalia Roberto Romano, professor de Ética Política da Unicamp.
Mas Romano lembra que, em contraponto a tudo isso, já surgiu na Câmara um movimento contrário: a imprensa descortinou um grupo de diretores procurando brechas legais para sonegar informações – especialmente na divulgação de notas fiscais. A tentativa de manobra apenas ilustra uma cultura que, modelada durante séculos de arbitrariedades, reluta em aceitar a palavra da moda.
– Ainda estamos todos acostumados ao sigilo e ao uso corrupto do sigilo, bem ao estilo do absolutismo – afirma Romano.
Não quer dizer que você, leitor, seja um totalitário em potencial. Significa apenas que o Brasil convive com um regime democrático desde o final dos anos 80 – nações como os Estados Unidos, por exemplo, usufruem da democracia há mais de 200 anos. O resultado é que, no Brasil, o governo federal ainda centraliza 70% do bolo tributário, os Estados pouco decidem sobre os próprios investimentos e os partidos são dominados por dois ou três caciques.
Controle nos gastos
– Somos uma democracia recente que terá novos avanços. Mas estamos presenciando a criação de mecanismos administrativos importantes. É possível vislumbrar um controle maior dos gastos públicos – analisa Ingrid Sarti, professora de Ciência Política e Relações Internacionais da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Quando um professor entra em greve pedindo aumento salarial, segundo Ingrid, a população tem o direito de saber quanto ele ganha de fato. Hoje, não é possível buscar esse dado com precisão, já que os contracheques incluem bonificações, triênios, funções gratificadas. Essas informações serão claras a partir de agora. Diz o historiador Marco Antonio Villa, da Universidade Federal de São Carlos:
– Isso tudo é uma vitória da cidadania. Mas a maior transparência é outra: é a que consegue, se não eliminar, domar a corrupção. Ainda não é o que estamos vendo.
Jornal Zero Hora - pág. 04 - 24/05/2012