quarta-feira, 3 de outubro de 2012

G1


Cientistas políticos e historiadores analisam o legado da era Collor

Especialistas comentam o que ficou de negativo e de positivo da época.
Votação do impeachment do ex-presidente completa 20 anos.


collor época da posse; 20 anos do impeachment (Foto: AE)Fernando Collor de Mello ao lado da ex-primeira-dama Rosanne Collor no dia da posse (Foto: AE)
 
Nos 20 anos da votação do impeachment do ex-presidente Fernando Collor de Mello, a serem completados no dia 29 de setembro, o G1 perguntou a cientistas políticos e historiadores qual foi o legado de seu governo. Os especialistas apontaram o que ficou tanto de negativo quanto de positivo dos anos Collor na história brasileira. Confira a seguir:

JOÃO FERES JÚNIOR
Professor do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ)

Herança positiva: O sistema político, mal saído de uma ditadura de mais de 20 anos, resistiu ao escândalo e ao “impeachment” do primeiro presidente eleito pelo voto popular, mostrando que havia, e ainda há, na sociedade brasileira um sentimento, um desejo democrático muito forte. Esse sentimento foi capaz de suplantar a nódoa simbólica da corrupção e sustenta até hoje nossas saudáveis instituições democráticas.

Herança negativa: Colocou a corrupção como questão central da política, contribuindo assim para a uma subcultura política neo-udenista em setores de nossa sociedade. Tal subcultura reduz a política ao binômio honestidade/corrupção, obliterando a própria política, que consiste em tomar partido a favor ou contra diferentes políticas e projetos públicos. Desse mal ainda não escapamos.
MARCO ANTÔNIO VILLA
Historiador e professor do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar)


Herança positiva: Nenhuma.
Herança negativa: Muitas. Uma delas: levou ao limite a indistinção entre o público e o privado. Transformou a coisa pública em coisa privada. Diria Antonio Rogério Magri, seu ministro do Trabalho: "desproclamou" a República.
 
ROBERTO ROMANO
 Professor de Filosofia Política da Unicamp

Durantes anos, após a queda de Fernando Collor, o referido monopólio ético, (do PT) somava-se aos laivos de socialização da produção, rompimento com organismos externos como o FMI, etc. Além da ética na política, circulou fortemente naquelas áreas a crítica às privatizações (que seriam marcas do período Collor, Itamar Franco e FHC) e ao chamado "neoliberalismo". Quando o PT (e boa parte de seus aliados de esquerda) chegou ao poder, todas as "bravatas" (a ética na política, a recusa das privatizações, a denúncia do neo liberalismo) foram engavetadas em nome do "realismo".

O período Collor serviu como catalisador ideológico e programático nas esquerdas nacionais, em especial no PT. Ele preparou a passagem das veleidades socialistas e contrárias às forças do mercado, para o realismo de hoje. Sem Collor, com certeza o caminho do PT seria diferente, inclusive sem o slogan enganoso e demagógico da "ética na política". Collor não venceu a inflação, não venceu a corrupção, não democratizou o mercado e a sociedade. Boa parte da leniência hoje ostentada pelas instituições nacionais diante da corrosão de valores republicanos se deve à sua presença no Planalto.

VERA CHAIA
Professora do Departamento de Política e do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, coordenadora e pesquisadora do Neamp (Núcleo de Estudos em Arte, Mídia e Política) da PUC/SP e do CNPq

Herança negativa: As eleições de 1989 podem ser consideradas um marco na política brasileira porque foi exatamente nesse período que se restabeleceram as eleições diretas para Presidência da República no Brasil, após 21 anos de regime militar. Aquele processo eleitoral foi marcado por uma cobertura extremamente tendenciosa, com edições de debates políticos e com o apoio irrestrito por parte da mídia da candidatura de Fernando Collor de Mello. Toda a imprensa escrita, bem como a televisão e o rádio, destacaram o "fenômeno Collor" como algo novo na política brasileira, "comprando" o slogan de Collor como o "caçador de marajás" e como o político que introduziria o Brasil no contexto internacional. Todos os outros candidatos e, principalmente, o candidato do PT Luiz Inácio Lula da Silva foram desqualificados pela mídia.

Herança positiva: Após 2 anos e nove meses a imprensa mudou sua posição e começou a atacar Collor (corrupção, caixa dois, desmandos). Os "caras pintadas" saíram às ruas exigindo a saída de Collor. O Congresso Nacional, depois de ouvir os apelos populares e também as elites políticas, resolveu abrir um processo contra o presidente Collor que resultou em seu "impeachment" ocorrido em dezembro de 1992.

Para ler mais notícias do G1 Política, clique em g1.globo.com/politica. Siga também o G1 Política no Twitter e por RSS.