sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Um outro texto, antigo, antigo...

Roberto Romano, Correio Popular 07/06/2005


Charge de Dalcio, Publicada em 7/6/2005, no Correio Popular de Campinas

Um governo Collor Dois: o PT que renegou a ética

A leitura dos comunicados emitidos pelo governo e por seus amigos faz o tempo retroagir ao presidente Collor, imediatamente antes da CPI que o expulsou. O atual governo age como se resultasse de uma retomada. FHC 3? Não! Collor 2! Governo Lula: o retorno collorido. A diferença está nos opositores. Naqueles dias, os núcleos do PSDB e do PT procuraram todos os meandros corruptos na “república das Alagoas”. Os tucanos passaram tempos no poder e as CPI foram vistas por eles como projetos eleitorais petistas. Estes últimos, alentados pelo erro estratégico dos então governistas, incharam a língua e as orelhas dos cidadãos com o falatório (bravatas) sobre a “transparência” política. Os tucanos agem no presente para redimir suas falhas. O PT as piora.

O presidente tudo faz para implodir a CPI. A troca de cargos por votos no Congresso abafa atos trazidos pela imprensa ainda não amordaçada e por setores éticos na política. Manobras para impedir investigações! Muitos não acreditam que o PT use hoje os “argumentos” expostos na CPI sobre Collor. O know how lhes é dado pelo capitão da tropa collorida, acolhido agora no Planalto. Roberto Jefferson berrava, na “era Collor”, que a oposição era “eleitoreira” e “nada” havia para ser investigado. Se existisse algo, a Polícia Federal faria o serviço, sob as ordens do governo. Jefferson é coerente. Ridícula metamorfose petista! Ex-defensores da ética exigem segredo. O despudor avançou tanto que os Robespierres precocemente aposentados ameaçam a CPI com manobras regimentais. PT e povo ficam em lugares opostos: a pesquisa CNT mostra que os eleitores têm consciência do que se passa nas salas escuras da bandalha. Eles aprovam a CPI.

A mesma CNT indica a vacilante popularidade do governo e do presidente. Apavorado diante de tantos escândalos, o Planalto nota o seu apoio descer de nível. O senador Suplicy é punido, os deputados éticos são excomungados e surgem personagens exóticos para defender o governo. No mesmo dia em que a pesquisa CNT foi publicada, um amigo do presidente berrou na TV: “o que deseja esta CNT? Quer mostrar poder ao presidente? Quer aparecer? O que significa mesmo CNT? (…) Acho isto uma babaquice”. O amigo presidencial chama-se, exatamente, Ratinho. O Planalto prefere tal pessoa e não escuta os 86% que, na pesquisa injuriada pelo Ratinho, querem a CPI dos Correios.

A vulgaridade perverte, como de hábito, a língua do governante: “aqueles que torcem pelo fracasso do Brasil vão quebrar a cara. Pode ficar certo de que vão quebrar a cara. Não existe espaço para política menor neste País”. Primeiro ele ordena que a imprensa olhe para a sua cara e nela veja despreocupação com atos corruptos. Agora, numa outra bazófia, identifica a sua pessoa ao País. A sua cópia hilária do “Brasil, ame-o ou deixe-o” afirma que os oposicionistas “torcem contra o Brasil”. Pouco rigor ético (na ética é essencial que o acusador adiante os nomes dos acusados e tipifique o suposto crime) define essa política liliputiana exatamente quando o presidente grita que “não existe espaço para política menor neste País”.

Existe, sim, presidente! Política micrológica surge no “é dando que se recebe” do seu governo. Aliás, já foi provido o cargo na Petrobras, o que “fura poços”? De algo assim dependem as manobras severinas contra a CPI. A política diminutiva se baseia na propaganda e foge dos fatos. A política menor invalida programas e os troca pelo culto à personalidade a que o senhor se acostumou no PT, do qual é proprietário. Mimado no seu partido, V.Excia. exige servilismo idêntico da República que não lhe pertence. A política anã se baseia em taumaturgias charlatanescas, afasta incentivos à indústria e ao comércio, grava com agiotagem os empresários, cobra impostos escorchantes. Duda Mendonça não transforma a segunda pior distribuição mundial de renda no “milagre do crescimento”.

Basta, presidente, de exaltar seu passado de operário retirante. Hoje, o senhor exibe um status social adquirido – a exemplo de Pedro Malasartes – à custa de promessas vendidas aos pobres. “Tudo” mudaria com a sua chegada ao poder. Política miúda se faz com essas “bravatas” quando milhões são iludidos. Os anjos petistas mostram a cara emporcalhada de tanto beijar mãos e pés dos “trezentos picaretas”. Política menor encontra-se na ousadia de V.Excia. ao identificar a sua própria figura ao País, ameaçando quem recusa latria ao “divino Lula”. A nossa pátria é imensa, ao contrário do senhor, que preside a miudeza dos intelectos.

Não existe poder que sempre dure. Após oito ou vinte anos, desaparecerá o petismo “franciscano”. O senhor habitará um rodapé histórico: “político autoritário que renunciou ao próprio sonho para chegar ao cimo da República”. O seu devaneio, presidente, esconde um horror vulgar. Os petistas servis ao seu governo não quebram a cara, pois não a possuem. Na superfície brilhante e vazia, onde antes tinham a face, eles refletem o líder fiel de Collor. “Com Jefferson ou sem Jefferson, todos eles são o Jefferson”. Nada mais.