quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Portal G 1. Eu disse que o Tribunal de Segurança Nacional, criado em 1936, ia contra a Constituição de 1934, que proibia foro privilegiado e tribunais de exceção. O Supremo, então, votou pela CONSTITUCIONALIDADE DO TRIBUNAL DE SEGURANÇA NACIONAL. DAÍ PODERMOS VER A DISTÂNCIA ENTRE O SUPREMO DE ENTÃO E O DE HOJE. O DE AMANHÃ, NAS MÃOS DO GOVERNO E DE UM SENADO SUBSERVIENTE, NINGUÉM SABE. TENHO MINHAS SUSPEITAS.

24/10/2012 07h02 - Atualizado em 24/10/2012 13h49

Especialistas elogiam julgamento do mensalão pelo STF

Supremo condenou 25 dos 37 réus e absolveu 12 acusados no escândalo.
Veja a análise de juristas, cientistas políticos e entidades sobre o resultado.

Glauco Araújo, Fabiano Costa, Rosanne D'Agostino e Tahiane Stochero Do G1, em São Paulo e em Brasília
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 Especialistas ouvidos pelo G1 avaliam que julgamento do mensalão, maior da história do Supremo Tribunal Federal (STF), representa um divisor de águas no Judiciário brasileiro, mostrando que é possível julgar livre de pressões políticas, de forma rápida e eficaz a todos, do mais humilde ao mais alto escalão, alterando a lógica de impunidade nos chamados "crimes do colarinho branco".

Ao longo de mais de 40 sessões, 25 de 37 réus acabaram condenados pelo pagamento de propina em troca de apoio político ao governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, entre eles, políticos da alta esfera do governo federal, como o ex-ministro chefe da Casa Civil José Dirceu, o ex-presidente do PT José Genoino, além de empresários, como o ex-publicitário Marcos Valério, deputados e dirigentes de instituições bancárias.

Veja a seguir o que dizem juristas, cientistas políticos e entidades ligadas ao combate da corrupção sobre os impactos do julgamento do mensalão:

Nelson Calandra, presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) "Acho que essa deliberação do Supremo, no exercício da sua competência originária, agindo como primeira e última instância, traça uma orientação nova para a deliberação de vários tribunais do Brasil, na medida em que adota a teoria do domínio do fato e isso faz toda a diferença no modo de julgar. Aqueles que são protagonistas dos órgãos de cúpula são responsabilizados por um ato porque se teria como impedir a ocorrência desse tipo de fato criminoso. Na verdade, no Brasil, sempre esse tema do caixa 2 foi banalizado. E só agora que o Supremo adotou uma posição dura sobre isso. De sorte que é muito positivo, passar a limpo a atividade política, eliminar essa questão do caixa 2. No fundo os políticos imaginam que tudo podem. A partir desse calvário eles vão repensar em tomar uma atitude como essa que lhes foi imputada na ação penal 470. Os debates mostraram que o STF tem agido democraticamente. O Brasil tende a passar a limpo várias coisas que ficaram no passado."

Márlon Reis, juiz de direito no Maranhão, co-fundador do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE)

"Representa um divisor de águas, porque o Brasil não está acostumado a ver sequer um julgamento efetivo de pessoas que detêm posições privilegiadas. E agora vê um julgamento independente, que não se curvou a posições políticas. Não consigo ver nesse julgamento nenhum tipo de pressão inidônea, porque os ministros estão acostumados a lidar com a opinião pública, com as divergências. Fico feliz com toda a independência. Está servindo para a uma abertura de precedentes, no enfrentamento da corrupção em matéria penal e abre espaço para uma jurisprudência. A maior lição é que o Judiciário precisa enfrentar com brevidade e muita independência todos os processos, envolvam quem for. A história que vemos é de muita leniência ao julgar pessoas poderosas. Essa é a quebra de paradigma para que as normas sejam respeitadas por todos."

Sepúlveda Pertence, ex-ministro do Supremo Tribunal Federal "Rios de tinta ainda vão correr sob a figura da nova interpretação do crime de lavagem de dinheiro, por isso esse tema dividiu ao meio o tribunal. Logo, a perplexidade que o julgamento gerou, uma concepção absolutamente ampliativa do que se pode considerar lavagem de dinheiro. Citou-se muito neste julgamento o processo contra o ex-presidente Fernando Collor, mas a discussão não é a mesma. O que a Corte entendeu àquela época é que a acusação deveria identificar o ato de ofício que teria sido o objeto do corruptor. O que se dispensou neste julgamento foi a prática do ato de ofício. No caso Collor, o ponto de discussão foi esse, que não se teria caracterizado o ato de ofício. Jamais se sustentou que era necessária a prática de um ato, e sim identificá-lo.(...) [Formação de quadrilha] é uma concepção bastante ampla. Como não acompanhei últimas sessões, prefiro não me manifestar. A impressão que fiquei é que se ampliou demasiadamente o conceito de quadrilha. (...) Evidentemente, é pouco concebível que o STF se ocupe três meses de um mesmo caso [em razão do peso para a administração da Corte]. "

Luís Roberto Barroso, advogado especialista em Direito Constitucional, professor titular da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, mestre pela Yale Law School "O comentário que posso fazer é sobre o que eu acho que esse julgamento representa institucionalmente para o Brasil. Eu acho que o julgamento mais do que a condenação de pessoas, ele é a condenação de um modo de fazer política, que tem marcado toda a República brasileira. Trata-se da condenação de um sistema eleitoral e partidário que faz o contrário do que se espera do processo civilizatório: ele exacerba os defeitos e reprime as virtudes. O julgamento, portanto, significa um momento desesperado da sociedade brasileira por reforma política. É preciso diminuir o peso do dinheiro e elaborar uma fórmula em que a eleição presidencial seja capaz de produzir também maioria no parlamento. O varejo da negociação política para a formação de maiorias que induz o fisiologismo e a corrupção. Este julgamento é tão excepcional nas suas circunstâncias que é difícil avaliar as suas consequências no plano jurídico."

Ophir Cavalcante, advogado e diretor do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) “A meu ver, o processo correu dentro da normalidade, foi sempre observado o devido processo legal e a ampla defesa para o convencimento do juiz. A maior lição deste julgamento é que o princípio de que todos são iguais perante a lei é aplicado sempre a todos, indistintamente, do mais alto escalão até o mais humilde. Pretende-se mudar a lógica da impunidade, de que nada acontece com quem tem cargo de poder. No duelo entre defesa e acusação, a defesa sempre tenta buscar a absolvição e a acusação mostrar as provas. Acho que ambos tiveram todas as garantias para o exercício profissional. Não acredito que gere jurisprudência a partir do julgamento, mas defendo que o princípio secular garantista do “In dubio pro reo” (a dúvida favorece o réu) será usado no critério de desempate. Uma Corte como o STF tem o dever de proteger o maior bem do cidadão, que é a liberdade. Com o julgamento do mensalão, ganha a Justiça, sai fortalecido o STF, ganha a democracia e ganha a República brasileira.”

Roberto Romano, professor de Ética e Filosofia na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) “Este julgamento sinaliza uma mudança de comportamento do STF, que naturalmente vai repercutir nas outras instâncias. O STF não tem história que o lisonjeia, não tem passado de cidadania, mas de apoio ao governo. Basta lembrar do período Vargas, decisões que foram tomadas absolutamente contrarias à democracia, como a autorização para criação do Tribunal de Segurança Nacional, em 1934, sendo que isso não era permitido pela Constituição. A grande novidade desta decisão é que, pela primeira vez, o corpo do STF toma uma atitude contra um partido que controla o governo federal. É um marco na história do STF e da Justiça brasileira. Destaco ainda a inovação do Supremo, com a transparência de expor a votação nas TVs, ao público. Para mim, o mais admirável voto durante todo o processo, não pela personalidade, mas pela qualidade dos votos, a doutrina, o saber, foi o ministro Celso de Mello. E o mais importante trabalho foi o do presidente da Corte, Ayres Britto, que conseguiu, com habilidade, levar o julgamento adiante, intervindo sempre que necessário, mas nunca questionando o conhecimento jurídico de um ou de outro colega, sempre com prudência. Encerra seu período no STF com chave de ouro.”

Ricardo Caldas, professor e diretor do Centro de Estudos Avançados (CEAM) na Universidade de Brasília “Penso que o procurador-geral da República [Roberto Gurgel] teve um papel importante no julgamento, pois atuou mesmo sendo questionado por falta de iniciativa. Acho que ele poderia ter sido mais incisivo, pois omitiu algumas pessoas importantes da lista de acusados dele. Ele também deixou de questionar a atuação de ministros do STF, como o José Dias Toffoli, o que foi surpreendente. Além disso, o próprio Toffoli não ter se declarado impedido. E teve o Ricardo Lewandowski, por suas relações com os envolvidos no julgamento, que também não se declarou impedido. A classe política, e há exceções, entende que não será afetada. Isso pode mudar muito pouco. O impacto das condenações do mensalão no sistema político será pequeno. O próprio TSE está permitindo que candidatos com ficha suja participem das eleições. Acho que o princípio da ficha limpa veio para ficar, mas a real operacionalização disso vai demorar. Vai demorar para termos uma geração de políticos e juízes incorruptíveis.”

Cláudio Weber Abramo, diretor executivo da ONG Transparência Brasil “As consequências do julgamento para o PT ou para o Lula são fugazes. Daqui um ano ninguém vai se lembrar. Alguns aspectos são relevantes, principalmente o fato de o STF ter condenado indivíduos bem situados na política, mas isso não pode ser comemorado, pois um fato só não faz milagre. O julgamento do mensalão, pelo fato de ter condenado gente, só terá efeito, em longo prazo, se outros casos de condenação por corrupção também ocorrerem. O efeito didático só vai ocorrer se as condenações forem sistemáticas daqui por diante. Caso isso não ocorra, isso será um caso isolado. É muito comum no Brasil que a Justiça exija que se prove causa e efeito em situações de recebimento de algum dinheiro por agente público. Mas isso é impossível provar que aconteceu. Para essa condenação, é preciso ter o dom da telepatia.”

Diego Werneck e Vitor Chaves, da Fundação Getúlio Vargas "Se o Supremo mantiver essa posição no futuro, uma coisa é certa. Um funcionário público terá de pensar duas vezes antes de receber qualquer vantagem em razão de seu cargo. Não bastará dizer que não fez, nem prometeu fazer nada em troca". Leia mais em "Legados do Mensalão", no blog Traduzindo o Julgamento do Mensalão.

Alexandre Camanho, presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República "Supremo reconciliou-se com o conceito seminal de República e fez por merecer o reconhecimento de ser o mais alto Tribunal do país, porque a ele cabe, mais do que a ninguém, defender as garantias e princípios da Constituição. Neste julgamento, é certo que o fez magistralmente. Fez, a um só tempo, Justiça e História". Leia mais em "Supremo faz História e reconcilia-se com o conceito de República", no blog Traduzindo o Julgamento do Mensalão.

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