20/04/2010 - 18h59
Carlos Arthur Nuzman sofre derrota no Senado
Por unanimidade, Comissão de Educação e Esporte resolve recomendar a rejeição das emendas propostas pelo presidente do Comitê Olímpico Brasileiro que controlavam uso de termos relacionados com os Jogos de 2016
Na ausência de Nuzman, Leonardo Gryner não consegue defender COB. Proposta de restringir palavras ligadas aos Jogos 2016 foi rejeitada |
Afonso Morais, especial para o Congresso em Foco
A decisão foi unânime. Nove senadores rejeitaram a proposta do presidente dos Comitês Olímpico Brasileiro (COB) e do Rio 2016 (CORio 2016), Carlos Arthur Nuzman, para alterar duas leis federais que regulamentam a proteção aos símbolos olímpicos. Como o Congresso em Foco publicou ontem (19), a intenção de Nuzman era aumentar de forma exagerada a lista de restrições, proibindo a utilização, mesmo que claramente não comercial, de termos como Olimpíadas e Jogos Olímpicos, a não ser com autorização expressa do COB e pagamento de royalties. Levada ao pé da letra, a restrição proposta do Nuzman poderia proibir mesmo a realização de Jogos Olímpicos escolares ou a já tradicional Olimpíada de Matemática. Além disso, o presidente do COB estendia a lista de palavras restritas, incluindo termos como "Rio", "Rio de Janeiro", "2016" e até "medalhas" e "patrocinador".
Durante audiência pública realizada na manha de hoje, na Comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado Federal (CE), alguns parlamentares ironizaram a sugestão polêmica do COB para restringir o uso de palavras usadas no cotidiano.Ao final, a presidente da sessão, senadora Marisa Serrano (PSDB-MS), comunicou que a Comissão de Educação enviará ofício ao presidente do Senado, José Sarney (PMDB-MA), informando que a reunião foi realizada e que as alterações propostas nas Leis 12.035 (Ato Olímpico) e 9.615 (Lei Pelé) não foram aprovadas.
De acordo com a reportagem publicada com exclusividade pelo Congresso em Foco ontem (19), Nuzman enviou carta a Sarney, na surdina, propondo a alteração nas duas normas para, segundo o CORio 2016, proteger os símbolos olímpicos e, assim, impedir o marketing de emboscada – ação de empresas não licenciadas para tirar proveito da exposição e lucro com os Jogos. A intenção de Nuzman era incluir novos termos no Ato Olímpico – que já proíbe o uso comercial das expressões “Olimpíadas” e “Olímpico” –e a eliminação de um trecho da Lei Pelé que garante a utilização dos símbolos olímpicos para fins educacionais.
O problema foi a forma utilizada por Nuzman - uma carta a Sarney - e a extensão exagerada das restrições que ele propunha. Durante a reunião, alguns senadores criticaram a maneira escolhida por Carlos Nuzman de encaminhar o documento. “Foi atípica e inusitada a forma que o COB conduziu sua proposta para criar um projeto de lei”, reclamou Álvaro Dias (PSDB-PR).
E questionou a ausência do dirigente esportivo, que mandou um representante, o diretor de Marketing do COB, Leonardo Gryner, à audiência. Ontem (19), Nuzman esteve em outra comissão do Senado, a de Infraestrutura, para tratar das obras relativas aos Jogos. “É uma demonstração de desinteresse. Nuzman nem veio defender pessoalmente sua proposta. A carta que enviou ao presidente Sarney reiterava pedido de urgência, mas ele preferiu comparecer a outra comissão e hoje não apareceu na CE. A proposta deveria ser ignorada como ele ignorou a audiência”, atacou Álvaro Dias. O ministro do Esporte, Orlando Silva, como Nuzman convidado para a audiência, também declinou do convite e nem mandou representante.
Piada olímpica
Mesmo acompanhado por três advogados, o diretor de Marketing do COB, Leonardo Gryner, escalado por Nuzman para representar a entidade, não convenceu os parlamentares e aparentava constrangimento. Depois de uma apresentação burocrática sobre direito de exclusividade e da importância da marca dos Jogos Olímpicos, Leonardo ouviu questionamentos sobre uma potencial violação da liberdade de expressão e foi alvejado com perguntas bem humoradas, algumas beirando o sarcasmo. Caso das perguntas do senador Cristovam Buarque (PDT-DF), segundo ele enviadas por eleitores por e-mail. “Como vamos fiscalizar? Não seria exagero restringir tantas palavras que usamos no dia-a-dia? Qual seria a punição de quem insistir em usar os termos proibidos? Temos de pagar aos gregos que inventaram as Olimpíadas? É uma piada olímpica?”, questionou Cristovam.
Ao final, Cristovam obteve de Gryner uma resposta significativa. Ele perguntou se o aumento das restrições para o pagamento de royalties eram "uma questão moral ou fonte de recursos". Ao que Gryner respondeu: “É moral e também fonte de recursos”, admitiu Gryner.
Primeiro a falar, o co-autor do requerimento da audiência pública, senador Flávio Arns (PSDB-PR) lembrou dos princípios da Carta Olímpica que respeita a educacao e os valores éticos e se mostrou preocupado, caso as propostas de Nuzman se tornassem lei, com a realização de eventos tradicionais no Brasil como as Olimpíadas Nacionais das APAEs e dos Militares, por exemplo. “Não se pode acreditar que essas instituições queiram usar comercialmente os termos em questão”. E completou: “É preciso avaliar caso a caso para identificar o oportunismo de empresas oportunistas e não elaborar novas leis”. O representante paranaense também se posicionou contra a alteraçao da Lei Pelé, por entender que o olimpismo é uma filosofia de vida e deve ser usado em atividades educacionais.
Para Álvaro Dias, a proposta é exagerada e abusiva. “Parece que estão querendo estabelecer uma ditadura”. E menosprezou a ausência do ministro do Esporte, Orlando Silva. “Ele não precisava estar aqui. Não vejo razão para estarmos aqui para discutir tais propostas. Tratamos de assunto que extrapola as necessidades”. Antes de encerrar, fez um alerta: “Os interesses comerciais estão se sobrepondo aos direitos constitucionais”.
O relator do Ato Olímpico, Inácio Arruda (PCdoB-CE), do mesmo partido do ministro do Esporte, lembrou que o decreto foi determinante na conquista do Rio de Janeiro como sede dos Jogos 2016, mas reforçou que já existem leis suficientes para garantir os direitos reivindicados pelo COB. Interpelado por Leonardo Gryner que comentou que a publicidade brasileira é muito criativa e, por isso, é preciso prevenir ações oportunistas, o senador cearense arrematou: “Se o setor publicitário é criativo, com essa proposta, o COB demonstra ser ainda mais criativo”, ironizou.
O advogado especialista em propriedade intelectual André Giachetta é favorável à proteção dos símbolos olímpicos, mas questionou a necessidade da formulação de novos dispositivos legais para garantir o direito de exclusividade dos patrocinadores oficiais dos Jogos e, principalmente, o argumento do COB sobre o marketing de emboscada. “A Lei da Propriedade Intelectual já prevê e normatiza a questão. A proposta enfatiza o que já existe, não acrescenta nada”, explica. Para o advogado paulista é importante separar a importância dos Jogos Olímpicos da prática comercial ilegal. Ele ainda sugere que, caso ocorra uma mudança, seja no sentido de envolver o Judiciário para julgar o mérito. “É preciso agir com equilíbrio e ealdade comercial”, afirmou.