‘República das Famílias’ contamina o avanço da democracia brasileira.
Correio Popular de Campinas, 05/08/2012.
A disputa frequente entre os mesmos grupos ou famílias é algo natural no Brasil, segundo especialistas. Entretanto, eles afirmam que por ser comum, não significa que esse tipo de situação seja
benéfica para a sociedade. O cientista político Roberto Romano, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), diz que no Brasil predomina a “prática do favor”. “Sem ter uma rede de favores, na época do absolutismo, ninguém conseguia subir na escala social. Isso permanece até hoje”, relata.
benéfica para a sociedade. O cientista político Roberto Romano, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), diz que no Brasil predomina a “prática do favor”. “Sem ter uma rede de favores, na época do absolutismo, ninguém conseguia subir na escala social. Isso permanece até hoje”, relata.
Como exemplo dessa tomada do poder por famílias ou grupos específicos, no âmbito municipal, estadual e federal, ele cita pesquisas realizadas pelo baiano José de Oliveira Arapiraca. “Em nome da família do senador Antônio Carlos Magalhães (ACM), ele mostrou que existem centenas de escolas, além de praças e ruas. Já Rui Barbosa, possui apenas algumas dezenas. Os clãs tendem a aumentar seu poder através da apropriação da economia física ou simbólica.”
O professor de Direito Público da Pontifícia Universidade Católica (PUC-Campinas), Marcelo Monteiro, também cita a figura de ACM como exemplo. “Ele morreu, mas tem todos os filhos envolvidos na política. Aécio Neves é neto de Tancredo. O que depende é a índole e caráter de quem está concorrendo”, diz. Uma das formas mais comuns utilizadas para as famílias se perpetuarem no poder, conta, é colocar o filho ou a mulher para concorrer ao cargo. “Se não querem largar o poder, deve ser porque é muito bom. Mas, para que isso ocorra, só depende do povo. Não há como barrar que exista essa candidatura”, afirma o professor.
O resultado dessa conduta, de se manter os mesmos personagens na disputa por cargos de poder, impede que o Brasil avance na modernização do estado e da sociedade, afirma Romano. “Ele se elege, depois é a esposa ou filho, e assim por diante. É o patrimonialismo brasileiro. Essas pessoas vão tratar das coisas da Prefeitura como se fosse o quintal de suas casas, assim como ocorreu no governo Hélio (de Oliveira Santos) onde a esposa (Rosely Nassim Jorge Santos, que ocupou o cargo de chefe de Gabinete no governo do marido em Campinas) ficou responsável por fazer a passagem do cofre público para o privado”, aponta.
Para o marqueteiro João Miras, não são poucos os políticos que não possuem preparo para administrar uma cidade ou que tenham legitimidade conquistada por verdadeira representação social, por ter defendido alguma causa mas, mesmo assim, se candidatam para manter o poder nas mãos de sua família. “A oligarquização na política é uma chaga na democracia brasileira”, afirma.
Como comparativo, Romano, cita a máfia italiana, que espalha o terror onde se instala, tirando benefícios de diversas atividades ilegais que gerem lucro. “Não por acaso, ela se divide em famílias. Os interesses delas está acima dos interesses da nação, estado ou município”, ressalta. As opções por ideologia, que deveriam ocorrer por meio dos partidos, explica, fica contaminada e sequer existe, pois os mesmos protagonistas dominam as legendas. “É um nó cego que impossibilita a passagem do estágio do absolutismo para a democracia republicana. Hoje, o que há é a república das famílias”, aponta o professor Romano.