Como deter a corrupção política no País
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- Publicado em Domingo, 19 Agosto 2012 21:28
- Escrito por Guilherme Calderazzo
O
País acompanha o julgamento da Ação Supremo Tribunal Federal (STF), em que os ministros da
Corte avaliam se houve o uso de dinheiro público ou privado ilegal para o
financiamento de campanhas político-eleitorais ou, ainda, compra de
parlamentares, a fim de que votassem a favor do governo no Congresso
Nacional.
Antes de darem as sentenças sobre as denúncias presentes no processo, o
caso tem estimulado o debate e o questionamento sobre a organização e o
funcionamento do sistema político brasileiro. Discute-se o que deve ser
mudado, para que as ilegalidades políticas sejam superadas.
Diante disso, há debates a respeito dos financiamentos eleitorais, isto
é, se devem ser apenas públicos, e se os candidatos precisam ser eleitos
em distritos e não mais em colégios eleitorais formados por toda a
cidade ou toda a unidade da federação, como é hoje.
Ainda há discussões sobre a validade da proposta relacionada à formação
de listas fechadas de candidatos às eleições proporcionais pelos
partidos, e a respeito da redução de cargos de livre nomeação no Estado.
Para especialistas, o Mensalão por si só não será um divisor de águas
na política interna. As mudanças e o fim da corrupção e do caixa 2
eleitoral só ocorrerão por meio de reforma política.
Um desses especialistas é Claudio Weber Abramo, diretor executivo da
Transparência Brasil, organização autônoma e independente de combate à
corrupção. "O Mensalão sozinho não trará mudan-ças, até porque caixa 2
nesse caso é marginal. O que o caracteriza é a coleta de propinas de
diferentes origens e motivos, via esquema de Marcos Valério", diz.
Roberto Romano (foto), professor de Filosofia Política na pós-graduação
da Unicamp, também avalia que o caso não mudará o funcionamento do
sistema sem a reforma política. "O caso é apenas o ápice de um processo
inteiro de atividade ilegal, que une forças e interesses econômicos e
políticos da sociedade civil e operadores do Estado, em especial no
Executivo e no Legislativo", afirma. E acrescenta que uma mudança apenas
virá com reforma política.
No que diz respeito ao financiamento público das campanhas, para evitar a
influência do capital privado nas eleições, Abramo é contra a proposta.
"Uma das peculiaridades do sistema eleitoral brasileiro é uma grande
influência do capital nas eleições. É esperado, uma vez que as empresas
sempre têm interesse em influenciar as decisões de políticos. A ideia de
proibir o financiamento privado nas eleições é uma insensatez. É
impossível evitar isso", diz.
Segundo ele, se for proibido, "o que hoje é caixa 1, uma vez que as
doações têm de ser informadas e registradas, vai se transformar em caixa
2". Acrescenta que uma das formas de melhorar o financiamento de
campanhas políticas é por meio do "matching funds", por exemplo. Para
ele, o mecanismo procura estimular a pequena doação da pessoa física
para campanhas de candidatos. "O candidato comprova que recebeu "x" de
pessoas físicas. O Estado, por sua vez, doa-lhe a mesma quantia. Esse
mecanismo teria a vantagem de comprometer mais o eleitor individual com o
candidato. O doador iria acompanhar o desempenho do eleito, cobrá-lo
sempre pelo desempenho político", diz Abramo.
Para Romano, o financiamento de campanhas políticas pode ser público ou
privado. "O problema de caixa 2 e financiamento eleitoral ocorre muito
por causa dos dirigentes partidários, que se tornaram tutores das
siglas", diz. Segundo ele, os dirigentes partidários ficam muito tempo
no comando das siglas e controlam as alianças, os candidatos e o cofre
do partido. São os cartolas da política", diz.
Para ele, mais urgente do que discutir tecnicamente a origem do
dinheiro, é mudar a estrutura do partido. "É preciso exigir que os
dirigentes partidários tenham mandato curto, de no máximo quatro anos.
Nos partidos é necessário ter eleições primárias para a escolha dos
candidatos. Os militantes e filiados têm de ter o controle dos fundos e
do caixa da sigla", afirma Romano.
Voto distrital e lista – Abramo diz que o defensor do voto distrital
não tem noção do que seja o mecanismo. "Foi idealizado para favorecer o
domínio de políticos sobre os tais distritos eleitorais. No essencial, é
o renascimento dos currais eleitorais", garante.
O voto em lista de candidatos organizada pelo partido, em debate para
proibir o financiamento eleitoral privado, beneficiará quem já tem
mandato e as direções partidárias, avalia Abramo. "Quem vai estar em
cima da lista são os sujeitos que já estão exercendo as funções de
comando no partido. Os vereadores, deputados estaduais e federais e quem
dirige o partido vão estar em cima da lista. Serão os nomes a serem
eleitos, para os quais os votos vão ser dirigidos em primeiro lugar",
assegura o especialista.
Abramo aponta outras distorções do sistema político e da democracia, mas
propõe soluções para superá-las. Por exemplo, segundo ele, "o poder
Legislativo é um poder inútil sob o ponto de vista da sua justificativa
institucional. Não representa a população, aqui e em outros países".
A principal função do Legislativo não é legislar, afirma. "É fiscalizar o
Executivo." Acrescenta que a função fiscalizatória é neutralizada pela
compra de parlamentares pelo Executivo por meio da distribuição de
cargos na administração e, ainda, pelo atendimento do que propõem as
emendas criadas pelos políticos.
Limite de emendas – Segundo ele, é preciso emendar a Constituição no
sentido de limitar o número de pessoas que podem ser nomeadas livremente
para cargos comissionados na administração pública. "As emendas
parlamentares deveriam ser cumpridas de acordo com a lei. Poderia ser
por meio da Lei de Diretrizes Orçamentárias. Do ponto de vista
institucional, com essas práticas, acabaríamos com o achaque ou
chantagem de político contra o chefe do Executivo e, ainda, evitaríamos a
ineficiência no funcionamento do Estado."
Para Romano, os partidos e os políticos têm como finalidade última
promover sua ascensão social, econômica e política às custas do
eleitorado. Para garantir isso, assegura, usam instrumentos do Estado,
no Legislativo e no Executivo, para criar comitês eleitorais deles.
"Usam asses-sores como cabos eleitorais, por exemplo. O que é uma
anomalia", justifica.
Tirania – Acrescenta ainda que os agentes públicos eleitos têm
privilégios, que não são prerrogativas de Estado, outorgados pelos
próprios operadores do Estado. "Com esses privilégios e os domínios dos
cargos, temos uma oligarquia no sentido exato da palavra. Há uma odiosa
separação entre o cidadão comum e o que opera o Estado. Isto é o
passaporte para a impunidade", explica Romano.
Ele acrescenta que é preciso pôr fim à tirania existente no Estado
brasileiro. "Tirano é aquele que usa os bens dos governados como se
fossem seus. Nosso governo é uma tentativa de democracia dominada pela
tirania desses operadores do Estado."
Atuação eleitoral – O direito de os partidos participarem das eleições
também se encontra no debate para melhorar o funcionamento da democracia
no País. Segundo Romano, para que uma sigla partidária tivesse direito
de participar das eleições para os poderes Legislativo e Executivo,
deveria ter um número, ter presença expressiva em muitos distritos e
cidades dos estados do País.
"O que é importante na lógica e na essência dos partidos é que ele
cresça na base da sociedade e, depois, se apresente como alternativa de
poder no Estado. Sempre lembrando que deve ter mecanismos internos
democráticos, com a realização de eleições primárias", diz Romano.
Partidos artificiais – Segundo Romano, hoje, políticos reúnem pequenos
grupos e alguns outros parlamentares, em vários estados, e criam
artificialmente um partido. "Em muitas das nossas organizações
partidárias, os programas do partido existem apenas para enganar a
Justiça Eleitoral."
Acrescenta que a grande quantidade de partidos no País não deriva de
divisões na sociedade nem de "projetos conflitantes no meio social e de
propostas democráticas com diferenças na organização do Estado e da
sociedade". Para ele, a maioria das agremiações políticas hoje atende
"única e exclusivamente aqueles que têm como profissão fazer política.
Esta distorção deteriora o ambiente político."