- Alvaro Caputo
Uma sociedade em que os idosos explodem
23 de agosto de 2012
Fernando Reinach (estadao.com.br)
Para
os animais sociais, os idosos podem ser um problema. Como o bem-estar
da comunidade depende do trabalho de todos os membros, os idosos, por
terem uma menor capacidade, contribuem menos para o grupo. Entre os Homo sapiens(nós)
esse problema foi resolvido com o sistema de aposentadoria. A solução é
compatível com nossa organização social por causa da grande ligação
afetiva que existe entre as gerações.
Além
disso, acreditamos que existe um grande valor no conhecimento acumulado
pelos mais velhos durante sua vida. Imaginar que soluções semelhantes
existam em outras sociedades complexas é um engano. Entre as formigas,
as trabalhadoras mais velhas se dedicam à defesa do formigueiro, uma
tarefa de alto risco que geralmente leva à morte. Do ponto de vista
biológico faz pouco sentido sacrificar os jovens, que têm um alto
potencial de contribuição, se existem indivíduos mais velhos que já não
podem contribuir com o bem-estar do formigueiro.
Como
disse Edward O. Wilson, um famoso estudioso das formigas: "Enquanto nós
enviamos machos jovens para o campo de batalha, as formigas enviam
senhoras idosas". Mas agora foi descoberto um processo ainda mais
estranho em uma sociedade de cupins. Ao envelhecer, os animais se
transformam em verdadeiras bombas ambulantes. Quando atacados por
invasores, explodem. É o suicídio dos idosos em prol da segurança do
grupo. Sem dúvida, um fim nobre em uma sociedade em que o afeto não
existe.
Os Neocapritermes taracua
são uma espécie de cupim que vive em florestas tropicais, no interior
de troncos de madeira em decomposição. Observando esses animais, os
cientistas verificaram que uma parte dos trabalhadores possuía duas
manchas azuis nas costas, localizadas na junção do tórax com o abdome.
Ao longo da vida, esses insetos sofrem diversas mudas (trocam de casca) à
medida que crescem. Mas, apesar de trocarem todo seu esqueleto (que nos
insetos está por fora do corpo e é chamado de exoesqueleto), as
mandíbulas não são trocadas.
As
mesmas mandíbulas são usadas durante toda a vida do animal. Com o
passar do tempo, as mandíbulas se desgastam e vai ficando difícil para o
animal cumprir suas tarefas. Esse desgaste das mandíbulas foi medido
pelos cientistas e serve como uma indicação da idade do animal. O que
foi observado é que, à medida que os animais envelhecem, surge essa
mancha azul, que vai crescendo e inchando. Parece que o animal está
carregando nas costas uma mochila azul.
Quando
o ninho dos N. taracua é atacado por inimigos, os membros idosos do
grupo, com sua mochila azul nas costas, podem ser observados na primeira
linha de defesa. Eles são muito mais agressivos e atacam imediatamente o
inimigo. Ao serem mordidos pelo inimigo, a mochila azul explode e
espalha seu conteúdo gosmento e tóxico sobre o inimigo. Os cientistas
observaram que também é possível induzir a explosão desses insetos-bomba
com um pinça - basta apertar o corpo do animal, simulando uma mordida.
Método. Usando
esse truque, os cientistas conseguiram isolar o "explosivo" azul
presente nas mochilas. Ele é composto por uma proteína que se liga a
íons de cobre (por isso é azul) e diversas enzimas poderosas produzidas
pela glândula salivar do inseto. Os cientistas ainda não sabem como essa
meleca grudenta elimina o inimigo, mas a observação dos combates entre
os velhinhos azuis e os invasores mostra que o método é eficiente. No
passo seguinte, os cientistas estudaram a anatomia das mochilas azuis.
Elas são sacos que se formam na costas do inseto e o material azul
acumulado no seu interior é produzido por uma glândula que se desenvolve
com a idade e tem a função específica de produzir o "explosivo" azul.
Quando as mochilas explodem, elas também libertam o conteúdo das
glândulas salivares que se localizam exatamente abaixo da mochila.
Nesses animais mais velhos, as glândulas salivares estão repletas de
enzimas digestivas, uma vez que as mandíbulas já desgastadas não
permitem que os vovôs mastiguem eficientemente a madeira do tronco onde
vivem.
Esses
resultados demonstram que nessa espécie de cupim, durante o processo de
envelhecimento, os animais, além de perderem sua capacidade de
trabalho, passam por mudanças profundas, desenvolvendo essa nova
glândula, produzindo seu conteúdo azul, acumulando as enzimas da saliva e
se transformando lentamente em verdadeiros "velhos-bomba". Tudo isso
para se prepararem para sua última tarefa, defender o ninho do ataque
inimigo, explodindo gloriosamente.
* BIÓLOGO
MAIS INFORMAÇÕES: EXPLOSIVE BACKPACKS IN OLD TERMITE WORKERS. SCIENCE, VOL. 337, PÁG 436, 2012