Brasil, Turquia e Irã anunciaram um “acordo” para solucionar o impasse sobre o programa nuclear iraniano. Pelo “acordo”, o Irã aceita entregar 1.200 kg de urânio enriquecido a 3,5% à Turquia; no prazo de um ano, os iranianos receberiam de volta 120 kg de urânio enriquecido a 20%, na Rússia e na França, para uso em reatores para fins médicos. Com isso, em tese, o Irã não poderia enriquecer seu urânio para fabricar uma bomba atômica. Parece bom, não é? Mas há uma pegadinha aí.
Os termos do “acordo” do final de semana são idênticos aos que as potências ocidentais, a Rússia e a ONU alcançaram em outubro passado com Teerã – e que depois foi abandonado pelos iranianos. A diferença é que, em vez da Turquia, era a Rússia que guardaria o urânio iraniano. Na ocasião, o acordo era aceitável para as potências porque os 1.200 kg eram todo o material nuclear de que o Irã dispunha; hoje, porém, há séria desconfiança de que os iranianos tenham muito mais do que isso em estoque – ou seja, enquanto entrega urânio para ser enriquecido a 20% no exterior, o Irã ainda terá urânio para enriquecer a 90%, que é o necessário para fazer a bomba.
Assim, o “acordo” entre Brasil, Turquia e Irã na verdade não diz respeito ao impasse iraniano com as potências do Conselho de Segurança da ONU. Os objetivos de Teerã são outros: ganhar tempo, explorar a aliança com integrantes temporários do Conselho de Segurança (Brasil e Turquia) e adiar as novas sanções, sem mexer significativamente com seu projeto nuclear. Para brasileiros e turcos, por outro lado, o “acordo” é útil porque supostamente lhes dá peso diplomático “global”, que é o que Lula e o premiê turco, Recep Erdogan, buscam reafirmar a cada gesto – mesmo que o tal “acordo” não valha o papel em que está escrito.