sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012
As limitações da democracia representativa do Blog de JOANA LOPES, Portugal, aqui
Um grande texto de J. M. Correia Pinto, para ler e reflectir:
Excertos:
«Com o tempo a democracia
representativa, nomeadamente a que resulta da eleição em listas
partidárias fechadas, acabou consagrando o mandato incondicionado como
princípio incontestável, deixando de haver durante a sua vigência
qualquer possibilidade de controlo dos eleitos, salvo o que resulta da
pressão da opinião pública, cada vez mais ferreamente condicionada e
manipulada pelo poder, do establishment, que tudo faz para que a opinião
pública tenda a coincidir com a opinião publicada, sendo esta altamente
limitada e controlada pelos detentores dos órgãos de informação. (…)
Contrariamente ao que por vezes
se ouve dizer, isto não significa que antes da consolidação da
democracia representativa como forma de governo não tivesse havido
outras tentativas, algumas relativamente bem conseguidas, de controlo do
poder, nomeadamente por via dos chamados corpos intermédios, que na
prática funcionavam como uma verdadeira divisão (horizontal) do poder,
com a vantagem, relativamente à actual divisão (vertical) do poder, de
esse poder moderador ser exercido por entidades pertencentes a diversos
estratos sociais enquanto a actual separação de poderes não impede que
todos os poderes estejam dominados ou hegemonizados pela mesma classe ou
pelos mesmos interesses.
E é essa a razão pela qual os
maiores obstáculos ao poder hegemónico continuarem a ser, ainda hoje, os
tais corpos intermédios. Daí a luta feroz que o capitalismo trava
actualmente tanto no plano político como no ideológico para desagregar
essas forças de resistência que, apesar de bastantes debilitadas,
continuam a ser as únicas que levantam dificuldades à sua insaciável
voracidade. (…)
A igualdade como princípio, isto
é, como ponto de partida e objectivo de chegada, é indissociável do
conceito de democracia. À medida que o princípio da igualdade foi sendo
postergado e até tido, como é hoje o caso, por inimigo da democracia
por, segundo o argumento mais corrente, causar graves danos à liberdade
individual e à capacidade individual de “empreendedorismo” e à medida
que foram sendo implementadas políticas que davam expressão prática
àquelas ideias, a democracia foi perdendo terreno, a ponto de hoje se
ter tornado, nomeadamente no Ocidente, numa caricatura assente numa
encenação ritual na qual o povo participa como figurante, mas de cuja
participação não tira quaisquer vantagens. (…)
Uma
coisa certa: se a democracia só puder sobreviver como representativa,
então ela vai ter que ser substituída por outra forma de governo que
assegure uma real proximidade entre os governantes e os reais interesses
da maioria esmagadora dos governados…
Não adianta argumentar com a
ideia de que pior do que a democracia representativa é a tendência hoje
corrente de governantes de outro país ou de forças fácticas poderosas
imporem aos governantes eleitos as medidas da governação. Apesar
gravidade das situações que se conhecem de que é exemplo mais
elucidativo a recente tentativa de Berlim impor um gauleiter a
Atenas, tudo isso faz parte da mesma questão. Autonomizar esta parte do
problema só serve para assegurar uma sobrevida à democracia
representativa tal como existe.»