Corrupção em 'tribunal' da Receita pode ser maior do que Lava Jato, dizem investigadores
Andreza Matais - O Estado de S. Paulo
26 Março 2015 | 10h 08
Há suspeitas de que valores do esquema de corrupção ultrapassem os R$ 19 bilhões, enquanto Lava Jato movimentou R$ 10 bilhões
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BRASÍLIA
- A Polícia Federal iniciou na manhã desta quinta-feira, 26, a Operação
Zelotes, que investiga crimes de corrupção, lavagem de dinheiro,
advocacia administrativa, tráfico de influência e associação criminosa
no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), que é uma espécie
de tribunal da Receita Federal. Investigadores acreditam que os
desvios investigados na Operação Zelotes podem superar os valores da
Operação Lava Jato, estimados em R$ 10 bilhões.
Há suspeitas que os valores possam ultrapassar os R$ 19
bilhões, referentes a 70 processos investigados. Já foram apurados
desvios de R$ 5,7 bilhões. Nas operações de busca realizadas durante a
manhã em Brasília, São Paulo e Ceará, já foram apreendidos R$ 1 milhão
em dinheiro vivo e carros de luxo.
O termo Zelotes foi escolhido para descrever falso zelo ou
cuidado fingido. Foram cumpridos mandados em dois gabinetes na sede do
Carf, em Brasília. As investigações apontam para o suposto envolvimento
do atual conselheiro Paulo Roberto Cortez e do ex-presidente do Carf em
2005, Edison Pereira Rodrigues. A PF cumpriu mandados de busca e
apreensão em endereços dos dois.
O Carf é um colegiado formado por funcionários do Ministério
da Fazenda e representantes da sociedade, cuja função é julgar recursos
em que contribuintes questionam a cobrança de tributos, multas e juros.
Segundo fontes informaram mais cedo, a organização atuava no
órgão patrocinando interesses privados, buscando influenciar e corromper
conselheiros com o objetivo de conseguir a anulação ou diminuir os
valores dos autos de infração e da Receita, o que resultaria em milhões
de reais economizados pelas empresas autuadas em detrimento do erário da
União. Servidores repassavam informações privilegiadas para escritórios
de assessoria, consultoria ou advocacia em Brasília, São Paulo e outras
localidades para que realizassem captação de clientes e oferecessem
facilidades no Carf.
Segundo notas divulgadas pela Receita e pela Corregedoria da
Fazenda, "constatou-se que muitas dessas consultorias teriam como sócios
conselheiros e ex-conselheiros do Carf."
As investigações, iniciadas em 2013, apontaram que grupos de
servidores estariam manipulando o trâmite de processos e o resultado de
julgamentos no conselho. A investigação se estende sobre julgamentos
suspeitos desde 2005.
Ao todo, foram expedidos 41 mandados de busca e apreensão e
determinado sequestro de bens e bloqueio de recursos financeiros dos
principais envolvidos. A Receita e a Corregedoria informaram que as
operações se estenderam a escritórios de advocacia e a salas de
conselheiros do Carf. A operação abrange Distrito Federal, São Paulo e
Ceará, e conta com a participação de 180 policiais federais, 60
servidores da Receita e três servidores da Corregedoria Geral do
Ministério da Fazenda.
O que é o Carf. O Carf julga processos na
esfera administrativa, em que contribuintes questionam a cobrança de
tributos. É um colegiado formado por funcionários do Ministério da
Fazenda e por representantes da sociedade. Ele é composto por três
seções de julgamento, cada uma especializada em um grupo de tributos.
Assim, por exemplo, a primeira seção julga casos relacionados ao Imposto
de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e Contribuição Social sobre o Lucro
Líquido (CSLL). Na segunda, vão os questionamentos sobre o Imposto de
Renda da Pessoa Física (IRPF) e contribuições previdenciárias. Na
terceira, estão os processos referentes ao PIS/Cofins, Imposto sobre
Produtos Industrializados (IPI), Imposto de Importação (II) e Imposto de
Exportação (IE). (Colaborou Lu Aiko Otta)