Cartunista é pressionado por Igreja Universal a retirar charge do Facebook
James Cimino
Do UOL, em São Paulo
Do UOL, em São Paulo
- Rodrigo Teixeira/DivulgaçãoCharge do cartunista Rodrigo Teixeira sobre os Gladiadores do Altar, da Igreja Universal do Reino de Deus
A assessoria jurídica da Igreja Universal do Reino de Deus pressionou
extrajudicialmente o cartunista Vitor Teixeira e retirar de sua página
no Facebook uma charge que, segundo ela, incita a intolerância
religiosa.
A charge, segundo seu autor, era uma crítica aos
Gladiadores do Altar, grupo de fieis da igreja que apareceram
recentemente em diversos vídeos divulgados nas redes sociais marchando,
batendo continência e usando uniformes análogos aos do Exército
Brasileiro.
O grupo virou alvo de críticas e de denúncias ao
Ministério Público por ter sido visto como análogo a uma organização
paramilitar. A Universal nega as acusações e diz que o grupo tem como
objetivo "pregar o Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo".
Na
notificação, a advogada frisa que o grupo promove atividades "culturais,
sociais e esportivas para auxiliar no resgate e amparo de populações de
rua, viciados, jovens carentes e em conflito com a lei".
No
desenho feito por Teixeira, um homem com capacete de gladiador e uma
camiseta com o símbolo da Universal enfia uma espada em uma mãe de
santo.
"Minha intenção foi denunciar uma empresa que, a meu ver,
está endossando a criação de uma suposta milícia. E não sou apenas eu
que acho isso, tanto que o assunto foi levado ao Ministério Público.
Estou debatendo a iniciativa de uma empresa, com sede internacional, com
um poderoso grupo de mídia por trás de si e com uma assessoria jurídica
que usou todo seu poder contra um cartunista independente. Eles dizem
que não irão me processar porque retirei a charge 'voluntariamente', mas
que opção eu tinha?"
Teixeira disse ainda que a imagem da mãe
de santo foi usada devido ao tratamento que a igreja dá às religiões de
matriz africana. Em 2007, o bispo Edir Macedo, fundador da Universal,
sofreu processo do Ministério Público e teve seu livro "Orixás, Caboclos
e Guias, deuses ou demônios?" retirado de circulação. Segundo o
desembargador Souza Prudente do TRF da 1ª Região, que negou liminar à
igreja para que o livro voltasse a circular, a obra transmitia mensagem
preconceituosa e discriminatória em relação aos adeptos de religiões
como o candomblé, a umbanda e a quimbanda, "além de estimular a
intolerância religiosa dos seguidores da congregação dirigida pelo autor
do livro àqueles que se dedicam às mencionadas crenças".
"Quando vi os vídeos daqueles gladiadores, pensei que se existia um
grupo que seria alvo deles certamente seriam as religiões africanas, que
já são atacadas em seus cultos", disse o cartunista. Na notificação, a
Universal nega que incite ódio contra essas religiões. Diz apenas que
"não concorda" com elas.
Liberdade de Expressão
Logo após o cartunista divulgar em seu perfil no Facebook a notificação
que recebera, a assessoria jurídica da igreja enviou outra
correspondência dizendo que a Universal "não trabalha nem nunca
trabalhou baseada em ameaças" e que "a pretexto da liberdade de
expressão, não é admissível a incitação ao ódio religioso".
Procurada pela reportagem do UOL sobre o caso, a assessoria de imprensa Igreja Universal do Reino de Deus respondeu:
"O autor produziu e publicou uma ilustração acusando a Universal
assassinar, ou de pretender matar praticantes de religiões de matriz
africana. Incitar o ódio é crime. Acusar falsamente de cometer um crime,
também é crime. No estado de direito, a liberdade de expressão não
autoriza ou legitima absurdos como tal imagem horrenda, veiculada de
modo irresponsável. Voluntariamente, o chargista apagou a postagem,
certamente por reconhecer o erro que cometeu. A Universal respeita e
defende as liberdades constitucionais de crença, de culto e de opinião.
Mas jamais aceitará calada ataques delinquentes de preconceito e rancor.
Casos semelhantes terão tratamento igual perante a Justiça."