Sexta, 14 de março de 2014
Com voto histórico, TRF4 impede a liberação de milho transgênico da Bayer
Decisão cria novos paradigmas jurídicos na matéria e também
poderá servir para que se reavaliem todas as demais liberações
comerciais de transgênicos no Brasil, já que em nenhum caso as empresas
fizeram avaliações de riscos em todos os biomas do território nacional.
A reportagem é publicada por Terra de Direitos, 13-03-2014.
Tribunal Regional Federal da 4ª Região – TRF4 decidiram, por unanimidade, anular a decisão da Comissão Nacional Técnica de Segurança – CTNBio que liberou do milho transgênico Liberty Link, da multinacional Bayer.
A decisão se deu sob o fundamento de ausência de estudos de avaliação
de riscos advindos do transgênico. A sessão julgou a Ação Civil Pública
proposta em 2007 pela Terra de Direitos, o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor – IDEC e a Associação Nacional de Pequenos Agricultores e a AS-PTA, que questiona a legalidade da liberação comercial do Liberty Link.
O relator da ação, desembargador Federal Cândido Alfredo Silva Leal Junior,
leu trechos de seu longo voto por aproximadamente uma hora e meia,
sustentando a necessidade de realização de estudos sobre os impactos
negativos dos transgênicos em todos os biomas brasileiros. Para Leal Junior, não bastam estudos realizados em outros países, pois a lei obriga que a decisão da CTNBio
esteja amparada em estudos que avaliem o impacto dos transgênicos em
cada um dos principais biomas do país. Além disso, o desembargador
condenou a CTNBio a elaborar normas que permitam à
sociedade ter acesso aos documentos dos processos que tramitam na
Comissão, possibilitando a uma participação qualificada da população nos
processos de liberação comercial.
As desembargadoras federais Marga Inge Barth Tessler e Vivian Josete Pantaleão Caminha, assim como o desembargador Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, seguiram integralmente a posição do desembargador relator, ressaltando a excelência do voto. Flores Lenz,
que em julgamento anterior havia votado pela liberação do milho
transgênico, mudou sua posição ressaltando que a análise do relator fará
história e criará um novo paradigma de interpretação da matéria.
Com essa decisão o milho transgênico da Bayer não
pode ser comercializado no Norte e Nordeste do Brasil, regiões onde não
foram feitos estudos técnicos sobre riscos ambientais e à saúde humana
advindos dos transgênicos. A decisão cria novos paradigmas jurídicos na
matéria e também poderá servir para que se reavaliem todas as demais
liberações comerciais de transgênicos no Brasil, já que em nenhum caso
as empresas fizeram avaliações de riscos em todos os biomas do
território nacional.
Para Fernando Prioste, advogado popular da Terra de Direitos
que acompanha o caso, a decisão terá grande impacto no tema, pois
obriga que se realizem estudos de avaliação de riscos em todos os biomas
brasileiros e obriga a CTNBio a dar ampla
transparência aos processos de liberação de transgênicos. “O voto de
hoje merece um estudo detalhado, pois aborda o tema com profundidade,
analisando os aspectos legais conjugando as consequências sociais e
econômicas da liberação de transgênicos no Brasil para as futuras
gerações”. Prioste aponta que, apesar do TRF4
ter agora uma posição firme na matéria, as empresas deverão recorrer ao
Superior Tribunal de Justiça e ao Supremo Tribunal Federal,
possibilitando ampliar ainda mais o debate.
“Após dez anos de liberação comercial de transgênicos do Brasil, o
debate sobre o tema se intensificou de forma mais complexa, expondo a
debilidade da agricultura baseada nos transgênicos e agrotóxicos. A
decisão judicial de hoje é um importante elemento que se somará à luta
popular por um modelo de agricultura baseado na agroecologia, que
garanta direitos aos agricultores e alimento saudável e sem agrotóxicos
para a população”, afirmar o advogado da Terra de Direitos.