segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Vale a pena pensar...


Índice geral São Paulo, segunda-feira, 23 de janeiro de 2012Mundo
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Irã ataca diplomacia de Dilma e diz que Lula faz muita falta

Porta-voz do presidente Mahmoud Ahmadinejad diz que Dilma destruiu anos de boas relações com país
Empresas brasileiras relatam que irritação iraniana com mudança de atitude do governo afeta comércio bilateral
SAMY ADGHIRNI
DE TEERÃ
O embaixador do Irã em Brasília, Mohsen Shaterzadeh, disse em recente entrevista que a relação com o Brasil continua tão boa no governo de Dilma Rousseff quanto foi na gestão de Luiz Inácio Lula da Silva.
Mas o tom que predomina em Teerã é bem diferente.
Autoridades iranianas enxergam claro distanciamento e já há sinais pouco amistosos em direção ao Brasil.
"A presidente brasileira golpeou tudo que Lula havia feito. Ela destruiu anos de bom relacionamento", disse à Folha na quarta-feira, por telefone, Ali Akbar Javanfekr, porta-voz pessoal do presidente Mahmoud Ahmadinejad e chefe da agência de notícias estatal Irna.
"Lula está fazendo muita falta", afirmou, numa referência à opção de Dilma, no cargo desde janeiro de 2011, de dar menos ênfase ao Irã.
Javanfekr corre risco de ser preso por supostas ofensas ao líder supremo, Ali Khamenei. Mas o porta-voz ainda é descrito pelo "New York Times" como "uma das mais fortes figuras para divulgar recados [do Irã]."
BARREIRAS
A irritação iraniana também se nota nas recentes barreiras contra exportadores de carne brasileira.
A União Brasileira de Avicultura afirma que as vendas de frango para o Irã, em alta até outubro, passaram a ser vetadas sem justificativa.
Já a multinacional brasileira JBS relata ter tido milhares de toneladas de carne bovina retidas por três semanas num porto iraniano.
A carga só foi liberada, dias atrás, depois que um representante foi despachado às pressas para Teerã. Importadores iranianos de carne relataram à Folha que Ahmadinejad enviou carta à alfândega ordenando que diminua a entrada de cargas do Brasil.
O caso é seguido com preocupação pelo Itamaraty, que garante não haver mudança na agenda com o Irã.
Mas, aos olhos de Teerã, a guinada sob Dilma ficou clara no voto na ONU ocorrido em março a favor de uma investigação sobre direitos humanos no Irã. Lula rejeitava pressionar os iranianos.
O Irã também lamenta o fato de o Brasil ter abandonado esforços diplomáticos para aliviar a pressão sobre o programa nuclear iraniano, suspeito de buscar a bomba atômica -o que Teerã nega.
Em 2010, Lula costurou com a Turquia um acordo, assinado em Teerã, para permitir que o Irã trocasse parte de seu estoque de urânio por combustível nuclear. Mesmo atendendo a pedidos dos EUA, o pacto acabou rejeitado pelas potências.
Por fim, o Irã se ressente do desinteresse brasileiro em promover reuniões bilaterais.
Em recente giro latino-americano, Ahmadinejad, ao contrário de 2009, não passou pelo Brasil. Não houve convite nem o Irã sentiu que caberia proposta de visita.
O embaixador Shaterzadeh menciona uma viagem de Ahmadinejad ao Brasil neste ano. Mas a Folha apurou que o iraniano deve visitar o país no âmbito da cúpula Rio +20 sobre temas ambientais, para a qual todos os chefes de Estado e de governo do mundo foram convidados.
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Retaliação iraniana desacelera comércio
DE TEERÃ
Se persistirem os obstáculos impostos aos exportadores brasileiros, o intercâmbio Brasil-Irã cairá em 2012, revertendo uma alta constante observada nos últimos anos.
Uma eventual queda afetaria principalmente o Brasil, já que as importações de produtos iranianos são irrisórias na corrente comercial.
De US$ 1,1 bilhão em 2008, as trocas saltaram para cerca de US$ 2,3 bilhões em 2011, segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.
Mas o ritmo do avanço despencou no ano passado, num reflexo das dificuldades nas exportações relatadas pelas multinacionais brasileiras de carne, que respondem por cerca de um terço das vendas diretas ao Irã.
"Desde outubro de 2011, os importadores iranianos não têm obtido licenças de importação junto ao governo do Irã nem mesmo conseguido utilizar as licenças que recebem", diz Adriano Zerbini, gerente de relações com o mercado da União Brasileira de Avicultura.
"Isso prejudica o exportador brasileiro, pois gera incerteza no curto e médio prazos", afirma Zerbini.
Autoridades iranianas reclamam do saldo amplamente desfavorável na corrente comercial e buscam maneiras de aumentar as exportações em direção ao Brasil.
Mas além das aparentes dificuldades na esfera política, o comércio bilateral deve sofrer também com a intensificação das sanções financeiras ao Irã, que inviabilizariam remessas entre bancos iranianos e estrangeiros.
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Embaixador vê Egito se aproximar de Teerã
Brasil quer uma maior cooperação com região CLAUDIA ANTUNES
DO RIO
O Egito pós-transição tenderá a ter uma relação mais próxima com o Irã, após anos de afastamento sob a ditadura de Hosni Mubarak, avalia o novo enviado especial do Brasil ao Oriente Médio, Cesário Melantonio Neto.
O embaixador diz que a hipótese tem sido mencionada por lideranças civis, como os diplomatas Mohamed El Baradei (ex-diretor geral da Agência Internacional de Energia Atômica) e Amr Moussa (ex-presidente da Liga Árabe e pré-candidato à Presidência).
Ela pode ser favorecida pelo Parlamento que toma posse em março, em que os partidos religiosos terão maioria.
"Não podemos prever se essa aproximação será intensa, de grande cooperação, ou apenas melhor do que a que existe hoje", disse Melantonio à Folha.
Se realmente ocorrer, a mudança será importante por matizar a rivalidade entre árabes e persas que marcou a região desde a Revolução Islâmica de 1979.
Na semana em que se completa um ano do início das manifestações que levaram à queda de Mubarak, Melantonio também prevê confrontos entre o novo Legislativo egípcio e os militares, que comandaram o país no último ano, por meio do Conselho Supremo das Forças Armadas.
"Acho que nem islâmicos nem militares sabem qual será sua estratégia. Ainda avaliam se vão promover uma queda de braço ou buscar uma conciliação", disse.
"O que os islâmicos já disseram, e isso cria confronto direto com os militares, é que não podem mais aceitar que o Orçamento das Forças Armadas não seja submetido e aprovado pelo Parlamento", analisa.
Ex-embaixador na Turquia, no Irã e no Egito (seu último posto), Melantonio assumiu como enviado especial em 1º de janeiro e ficará baseado em Brasília.
Segundo ele, o Brasil quer aprofundar a cooperação técnica com os novos governos da região em áreas como segurança alimentar e combate à pobreza.
Leia íntegra da entrevista
folha.com/ no1037900